Mercado investe em soluções para mitigar riscos em programas corporativos
A alta sinistralidade, a falta de investimentos em gerenciamento de riscos e até resistência em aplicar mudanças de rota são desafios do setor
InfoMoney - 20 de Março de 2024Os gestores de riscos nunca foram tão desafiados como agora. Os guardiões do patrimônio dos acionistas de hoje convivem com uma série de riscos globais interligados, desde questões geopolíticas, econômicas e sociais até tecnologia, clima e regulamentação, que tendem a aumentar em frequência e gravidade. E para complicar mais, um mercado de (re)sseguros quem vem difícil desde 2017 e se agravou com a contabilização das perdas causadas pelas consequências de pandemia, guerras e mudanças climáticas.
A colunista do Infomoney conversou com executivos que atuam
com grandes riscos para entender como o setor de seguros tem contribuído para
melhorar a vida dos gestores da área, que perdem o sono para mitigar incidentes
cibernéticos, como ataques de ransomware, violações de dados, interrupções de
TI e na cadeia de suprimentos.
Ilan Kajan, vice-presidente de riscos corporativos e
sinistros da Alper Seguros, afirma que o papel do broker (corretor) é ajudar o
gestor de risco nos desafios. “Hoje temos muitas questões não relacionadas ao
risco do negócio em si, que vão de inflação, taxa de juros, mudanças climáticas
e riscos geopolíticos”, explica. Se os EUA, por exemplo, aumentam os juros,
atraem o capital que poderia estar disponível para resseguro. O resultado se
mostra na redução da oferta de capital para uma demanda elevada de riscos
corporativos. E tem mais. “Perdas em qualquer parte do mundo, com elevação dos
pagamentos de indenizações por furações a pandemias e guerras, contaminam
outras carteiras e regiões, pois o ressegurador vai priorizar o equilíbrio
financeiro global do grupo” acrescenta Kajan.
Neste cenário de riscos conectados, de preços elevados e de
coberturas restritivas, o executivo da Alper conta que o corretor busca
capacidade em várias empresas para conseguir completar um painel de resseguro.
“Isso limita a opção ao cliente final. Quando o gestor pede uma oferta
alternativa, praticamente não há, pois todo o capital disponível no mundo já
está na oferta apresentada”, explica.
Uma das soluções das seguradoras tem sido reunir esforços da
diretoria atuarial com a comercial. O investimento nessa área visa resultados
sustentáveis ao longo do tempo, conhecendo melhor tanto os riscos que expõem o
capital do grupo, quanto como gerar valor aos clientes, compartilhando
conhecimento e apoiando a gestão de risco. “A incorporação da estrutura
comercial de corretores corporativos à área técnica segue um movimento já feito
na Espanha e que trouxe excelentes resultados na operação da Mapfre”, conta
Mauro Caetano, diretor de empresas e Seguros Gerais da Mapfre.
O principal objetivo é trazer eficiência operacional e mais
sinergia entre as áreas na unidade brasileira. “Acreditamos muito nesta
integração, pois além da simplificação de processos internos, o movimento
unifica a comunicação entre a área comercial e técnica com os corretores
corporate, possibilitando a oferta de produtos de forma ágil aos clientes.
Essas iniciativas já estão resultando em melhorias significativas no
relacionamento com os principais corretores e clientes da Mapfre”, afirma.
Guilherme Perondi, vice-presidente executivo Brasil e head
de distribuição LATAM na Swiss Re Corporate Solutions, conta que há 60 anos o
Grupo Swiss Re tem uma área chamada RES (Risk Engineering Services ou Serviços
de Engenharia de Riscos). Essa equipe tem uma dupla função: apoiar a subscrição
na análise e classificação dos riscos que o grupo assegura e auxiliar clientes
corporativos na avaliação e gestão dos seus próprios riscos operacionais.
“Contamos com uma equipe de engenheiros e técnicos em todo
mundo em diferentes especialidades como riscos patrimoniais, engenharia e
responsabilidades com conhecimento em vários setores como indústria pesada em
geral, energia, cadeia de suprimentos, exposições catastróficas e
sustentabilidade”, destaca.
Segundo Perondi, há um tema comum nas demandas que é a busca
por troca de conhecimentos com a equipe técnica. “Nosso engajamento com
clientes e corretores em geral é baseado em dados e expertise para suporte à
gestão de riscos, com objetivo de prevenção a perdas, incluindo uso de
tecnologia para análises de grandes volumes de dados”, cita. Outro valor
agregado solicitado com frequência são benchmarks e melhores práticas globais
ou do setor de atuação da companhia, que geralmente passam a ser incorporados
nos planos de gestão de riscos da empresa.
A Zurich criou há 25 anos uma equipe de engenharia de riscos
conectada a uma rede de especialistas global com mais de 8 mil engenheiros
especializados. “Entendemos que o gerenciamento de risco é fundamental para
aumentar a resiliência e sustentabilidade de nossos clientes, ao mesmo tempo em
que amplia o conhecimento de nossos subscritores para oferecer soluções de
seguros adequadas a cada empresa.
Acreditamos que os seguros corporativos não devem ser entendidos como
commodities, sendo nossos serviços de engenharia de riscos um instrumento para
identificar as exposições de nossos clientes e oferecer soluções sob medida.
Toda essa tecnologia também está disponível para os nossos corretores”, conta
Tiago Santana, superintendente de Engenharia de Riscos da Zurich.
Ana Carolina Mello, Vice-Presidente de Subscrição da AXA,
conta que a filial local da seguradora francesa não possui uma diretoria
específica para tratar do alinhamento entre equipe técnica e comercial. Porém,
essa é uma característica muito forte na maneira como a companhia trabalha e é
reconhecida no mercado por conta dessa interação entre comercial e área
técnica. “Em duas linhas de produtos, Vida e Transporte, já temos um
profissional técnico-comercial que faz os dois papéis porque esses são seguros
que temos parcerias com corretores especializados e que exigem um grande
conhecimento das características do setor e seus riscos para precificação e
montagem da proposta. Nas outras carteiras precisamos desse olhar mais técnico
para tirar dúvidas durante a negociação ou propor soluções mais complexas, de
maneira mais rápida”, cita.
PREÇOS MAIS ESTÁVEIS
A alta taxa de sinistralidade, a falta de investimentos em
gerenciamento de riscos, resistência e a limitação da capacidade para a
aceitação de determinados riscos no mercado são alguns dos fatores que explicam
os movimentos das taxas de seguros que vêm ocorrendo desde 2017.
Desde o segundo semestre de 2023, o mercado tem apresentado desaceleração e aumento de taxas, o que propicia mudança para um ciclo menos duro. Em algumas linhas, como D&O, esse movimento iniciou-se antes, já no final de 2022. “Em geral, esperamos um mercado mais ‘soft’ para os próximos anos, mas consolidando-se em patamar superior ao existente antes de 2020. A qualidade e a política de gestão de risco das empresas se consolidam como fatores fundamentais na decisão do mercado segurador e ressegurador”, acredita Santana.
“Para o seguro de grandes riscos, o ano de 2024 apresenta
desafios semelhantes ao de 2023. Todavia, entendemos que soluções customizadas,
mitigando os riscos associados, analisando de forma detalhada as exposições,
acompanhando a implementação dos programas de gerenciamento de riscos nas
empresas, e com as capacidades locais e globais de nossos times de subscrição,
poderemos ser assertivos e ajudar nossos clientes neste cenário de mudanças”,
aposta Givânia Silva, head comercial de corporate e brokers da Mapfre.
Perondi afirma que, globalmente, o mercado vem passando por
um período de ajuste estrutural e uma das consequências é a de exigências
quanto à qualidade de gestão de riscos. Inevitavelmente os compradores de
seguros comerciais e corporativos precisam estar preparados para essa mudança
estrutural pela qual o mercado está passando, especialmente em setores e
empresas com maiores exposições de risco, históricos de sinistralidade e maior
complexidade de gestão de riscos.
“As exigências de boas práticas de gestão de risco,
investimento contínuo em sistemas protecionais, transparência no
compartilhamento de informações e disponibilidade para discussões técnicas não
só sobre os riscos segurados, mas também sobre novas estruturas de
transferência de riscos, vão seguir como regra nas interações entre compradores
de seguro e o mercado de seguros e resseguros”, finaliza o executivo da Swiss
Re Corporate Solutions.
A conclusão é que o endurecimento do mercado de seguros
ensinou lições a todos que participam do dia a dia da construção de um programa
de seguros, incluindo conselhos de administração, agências de risco e órgãos
reguladores. Todos buscam informações e estão mais conscientes da conectividade
de riscos e isso se reflete na melhoria dos contratos de (re)sseguros.