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Saúde ganha relevância na bolsa

Setor já conta com duas companhias entre as 10 maiores

Valor Econômico - 03 de Março de 2021

O Valor Econômico relata que a recente união entre Hapvida e Intermédica e a chegada da Rede D’Or à bolsa, em dezembro, farão com que o setor de saúde comece, de fato, a ganhar representatividade na bolsa brasileira. Com valor de mercado acima de R$ 100 bilhões, ambas já figuram entre as maiores empresas listadas. “O IPO da Rede D’Or, de muito sucesso, deixa nítida a percepção de que o setor de saúde é subrepresentado na bolsa brasileira, com fundamentos muito fortes de crescimento e resiliência”, afirma Marcelo Millen, responsável pela área de mercado de capitais e renda variável do Citi.

Vários nomes do segmento acessaram a bolsa desde o início dos anos 2000, mas acabaram envolvidos em fusões e aquisições e fecharam o capital antes que o mercado pudesse contar com um grande nome. Com as luzes acesas para o segmento, há, no momento, sete companhias que preparam ofertas públicas inicias (IPOs), já em análise na Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Desde o IPO em dezembro, a Rede D’Or, maior rede privada de hospitais do país, já se valorizou 25%. Com R$ 137,4 bilhões em valor de mercado ontem, é a nona maior companhia listada. Já a empresa combinada a partir das operações de Hapvida e Intermédica, que integra rede hospitalar e operadoras, avaliada em R$ 115 bilhões, ficaria em 11º primeiro lugar.

Roberto Attuch, CEO da plataforma de análises independentes Ohmresearch, afirma que com grandes empresas o setor ganha visibilidade. “Isso tende a fazer com que outros empresários prestem atenção nas operações, nos valuations, e se animem para fazer também um IPO”, afirma. Renato Stuart, sócio da RGS Partners, destaca que uma nova onda de ofertas na bolsa daqui em diante virá como reflexo da liberação do capital estrangeiro em hospitais, em 2015. “As companhias atraíram investimento de private equities internacionais e agora a saída vai ser via bolsa”, avalia.

Na visão de um executivo do setor de private equity, saúde é um setor grande, importante, que passa por uma “tremenda” transformação no mundo todo com o envelhecimento da população e mudanças tecnológicas. No Brasil, diz ele, há condições específicas que aceleram as mudanças, como o fato de o Sistema Único de Saúde (SUS) não dar conta do atendimento da população, o que abre espaço para a iniciativa privada. “É um setor do mundo real, que não tinha quase nenhuma representatividade na bolsa e que vai precisar de muito capital para continuar a se transformar. Talvez seja um dos setores em que mais faz sentido abrir capital, uma vez que até pouco tempo atrás só havia laboratórios listados”, diz o executivo de private equity

Attuch, da Ohmresearch, avalia que o setor está cada vez mais atrativo para os investidores por conta da tese relacionada ao envelhecimento da população mundial. “Existe hoje um conjunto de temas de um portfólio moderno de investimentos. O principal deles talvez seja a energia limpa, mas a saúde, em particular tudo o que envolve a atenção ao envelhecimento, sem dúvida, é um deles”, diz.

Hoje, no Ibovespa, principal índice da B3, há seis companhias ligadas de alguma maneira ao setor de saúde que, juntas, na carteira teórica de 1º de março, tinham peso de cerca de 6,5%: Intermédica (2,5%), RaiaDrogasil (1,2%), Hapvida (0,8%), Hypera (0,66%), SulAmérica (0,45%), Fleury (0,4%) e Qualicorp (0,4%). Por conta dos critérios do Ibovespa, que envolvem tempo de listagem, a Rede D’Or só deve entrar no índice no fim do ano - segundo estimativas de mercado, a companhia poderá chegar com peso próximo a 3%. Nos mercados americanos e europeus, saúde representa entre 17% e 19% da bolsa, segundo um executivo de banco de investimentos que prefere não ser identificado. Mas por lá estão listados os grandes laboratórios, que não existem aqui. S

obre a falta de representatividade do segmento no mercado local, ele destaca que, por conta da elevada fragmentação, as grandes, como Rede D’Or, Intermédica e Hapvida, sempre foram verdadeiras máquinas de compra. “Elas cresceram sim organicamente, mas também a partir de muitas aquisições. Essas movimentações acabaram tirando da bolsa algumas candidatas a IPOs”, avalia. Ele acrescenta que o novo grupo que chegará à bolsa vem, como já se viu no passado, novamente de famílias e private equities que nos últimos anos vieram construindo empresas, até mesmo se inspirando na história dessas maiores.

“Repetiram a estratégia e, agora, vão buscar liquidez na bolsa”, afirma. Nada impede que essas empresas também sejam protagonistas ou alvos de uma nova onda de consolidação - há vários tipos de negócios da cadeia de saúde para serem listados. Na bolsa, elas passam a ter um valor de mercado e ações que podem ser moedas de negociação. Além disso, abrem mais dados sobre as suas operações.

Na visão de Attuch, Ohmresearch, a maior visibilidade que esse mercado de saúde ganhou com as grandes companhias em bolsa pode impulsionar novas operações de fusões e aquisições, que já marcam esse setor, pelo fato de ele ser muito fragmentado e haver complementariedade entre as empresas.

Stuart, da RGS Partners, observa que companhias de porte cada vez maior e mais profissionalizadas têm potencial para impactar toda a cadeia de negócios. “Elas alcançam escala para negociar insumos, conseguem oferecer mais benefícios e especializações aos profissionais de saúde, por exemplo. Isso tende a puxar a profissionalização de todo setor”, diz. Ainda segundo ele, uma empresa relevante em determinada região, ao ver a chegada de um grande competidor, capitalizado, terá de se mexer para não se tornar até mesmo um alvo.

Outro segmento ligado à saúde com destaque em bolsa é o chamado varejo farmacêutico, com as drogarias. Um banqueiro ouvido pelo Valor destaca que isso se deve ao fato de grande parte dos IPOs no Brasil ser de empresas com negócios ligados a consumo e varejo.

O exemplo de sucesso é a RaiaDrogasil, fusão de duas empresas listadas, que está no Ibovespa e vale hoje R$ 37 bilhões. Ano passado, com a retomada dos IPOs, esse ramo contou com reforços na bolsa. Listaram-se a D1000, que tem relevância no Rio de Janeiro e Centro-Oeste, e é uma subsidiária da Profarma, distribuidora de medicamentos; e a Pague Menos, com forte presença no Norte e Nordeste.

A Panvel, que nasceu no Sul do país, já era listada e fez uma oferta para aumentar sua liquidez. Esse braço do setor conta tanmbém com um fracasso: a BR Pharma, que chegou à bolsa em 2011 e faliu em 2019. Na história recente, o setor de saúde viu um verdadeiro entra e sai de empresas na bolsa. A rede de laboratórios de diagnóstico Dasa puxou a fila de IPOs em 2004, trazida pela butique Pátria.

Nos anos seguintes, fez muitas aquisições, teve dificuldades na integração, e o empresário Edson Bueno, criador da Amil, acabou assumindo o controle da empresa dez anos depois. Desde então, a Dasa tem percentual ínfimo, de pouco mais de 2%, de ações em circulação no mercado - agora prepara um “re-Ipo”. A Medial, de planos de saúde, se listou em 2006 e em 2009 foi adquirida pela Amil, que havia chegado à bolsa em 2007. Em 2012, foi a vez de a Amil, avaliada em R$ 11 bilhões na época, ser comprada pela americana United Health e sair da bolsa.

A OdontoPrev, de serviços dentários, vendeu ações em 2006 e teve o controle comprado pela Bradesco Saúde em 2014. A Cremer, fabricante de materiais descartáveis para saúde, fechou capital em 2018, depois de ter sido adquirida pela CM Hospitalar. Agora rebatizada de Viveo, ela tem como acionistas os empresários Carlos Mafra e Cleber Ribeiro e a DNA Capital, empresa de investimentos da família Bueno, fundadora da Amil, e também prepara um IPO.

Outra que fechou capital foi a Tempo Participações, de seguro saúde. A empresa chegou à bolsa em 2007 e, em 2015, teve o controle adquirido pelo fundo de private equity Carlyle. A Qualicorp, de planos de saúde, segue listada, mas com uma participação cada vez mais relevante da Rede D’Or - recentemente, ela subiu a fatia de 15,4% para 22,4%.

O setor ainda conta com outras companhias em bolsa, mas fora do Ibovespa, como as redes de laboratórios Alliar e Hermes Pardini, além da biofarmacêutica Biotoscana - todas se listaram a partir de 2016.