
Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras
QUANDO O RISCO É MUITO MAIOR
Toda seguradora e toda resseguradora tem um limite máximo de retenção de risco. Quer dizer, a companhia não pode aceitar qualquer risco, independentemente de seu tamanho, apenas porque acha que é um bom negócio. 22 de Março de 2024Toda seguradora e toda resseguradora tem um limite máximo de retenção de
risco. Quer dizer, a companhia não pode aceitar qualquer risco,
independentemente de seu tamanho, apenas porque acha que é um bom negócio. Ela
tem regras de retenção obrigatórias e que são impositivas para a operação da
companhia. Não respeitá-las a sujeita a sanções legais tão drásticas quanto
perder sua licença de funcionamento ou, na prática, ser banida do mercado
porque não terá parceiras para dividir os riscos e colocar seus excedentes.
Esta limitação tem uma razão de ser. Ela garante a solvência da
seguradora, protegendo todos os segurados porque, respeitados os limites, a
companhia terá os recursos necessários para fazer frente a suas obrigações.
É assim que é comum uma seguradora aceitar um risco muito maior do que
sua capacidade de retenção, transferindo para outras companhias, seguradoras ou
resseguradoras, o que exceder seus limites. Há casos em que a seguradora que
aceitou o risco fica com menos de 1% dele, transferindo os 99% restantes para
uma ou mais resseguradoras com quem tem um contrato para colocação automática
dos excedentes de sua carteira.
Mas esse contrato também tem limite, além do qual a seguradora precisa
encontrar outros parceiros, em outros contratos ou em colocação avulsa, para
aceitar o risco.
Esta regra é taxativa e, apesar de escrita de diferentes formas e levando
em conta diferentes fórmulas, ela é respeitada por todas as companhias de
seguros e de resseguros porque é ela que garante o funcionamento e a liquidez
do mercado.
Neste momento, o mundo se vê diante de riscos inimagináveis até poucos
anos atrás. O exemplo mais fácil de ser demonstrado – mas não é o único – são
os eventos decorrentes das mudanças climáticas. A ordem de grandeza tem
crescido ano a ano e agora temos ameaças capazes de atingir proporções além da
imaginação e os eventos mais recentes deixam claro que elas já estão aí.
O resultado é que as restrições para aceitação de riscos estão impactando
a proteção de seguros de estados como a Flórida, onde seguros para eventos
climáticos não são mais possíveis de serem contratados. Como comparação, até
recentemente, apenas a área urbana de Miami não conseguia cobertura para
furacões, agora é o estado inteiro. E essa realidade deve se espalhar por
várias outras regiões ao redor do planeta. Cobertura para incêndios florestais
devem ficar extremamente difíceis em países como Portugal, Espanha, Grécia,
Itália e França, para não falar em extensas áreas do Canadá, Estados Unidos,
Rússia e Brasil. É uma realidade dramática, mas que não pode ser ignorada, até
porque a alternativa para a não contratação de seguros é a intervenção dos
governos nacionais, os únicos com capacidade para fazer frente à nova ordem de
grandeza dos prejuízos possíveis.
Isto quer dizer que a sociedade precisa decidir o que ela quer, quais as
medidas de proteção ideais e como implementá-las. Para isto existe uma única
solução: todos devem conversar e definir os limites de atuação e
responsabilidade de cada um, governo, seguradoras e sociedade.