
Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras
RENDA E SEGURO
É comum se comparar a penetração do seguro no Brasil com a penetração em países como Estados Unidos ou Suíça. 17 de Março de 2023É comum se comparar a penetração do seguro no Brasil com a penetração em
países como Estados Unidos ou Suíça. É um erro. Essa comparação leva a um
resultado completamente diferente da realidade. Não há como comparar sociedades
tão diversas. A renda média da população é completamente diferente, os graus de
pobreza absoluta estão em patamares irreconciliáveis, a pujança da classe média
se mostra em níveis incomparáveis e por aí vamos.
Se fosse importante fazer uma comparação da participação do faturamento
do setor de seguros no PIB, ela deveria obrigatoriamente ser feita entre países
com base social semelhante, com a mesma desigualdade, com o mesmo grau de
pobreza e miséria. Se comparássemos a participação do seguro no Brasil e na
Índia com certeza teríamos números mais próximos da realidade.
O grande problema do seguro no Brasil, ou da penetração do seguro na
sociedade brasileira, é a estrutura social da nação. Um país que tem mais de
trinta milhões de pessoas passando fome e mais de cem milhões vivendo com até um
salário-mínimo não tem condições de ter um setor de seguros desenvolvido. Não
há dinheiro para isso.
Uma família que vive com um salário-mínimo por mês tem mais ou menos mil
reais líquidos para fazer frente a todas as suas despesas, entre as quais moradia,
alimentação e vestuário surgem em primeiro lugar. Se lembrarmos que a cesta
básica representa perto da metade do salário-mínimo, vemos que sobra bem menos
de mil reais por mês para pagar as despesas com moradia e vestuário e esse
número é insuficiente para fazer frente a elas.
Como, além desses três grupos de despesas, existem outras que podem ser
consideradas prioritárias, como gás, luz e água, qualquer outro gasto se torna
impossível, inclusive a eventual contratação de um seguro. Se não há espaço na
carteira da família para os gastos minimamente indispensáveis, como se
pretender que parte significativa da sociedade brasileira tenha um
comportamento diferente da realidade e que economize alguns reais por mês para
pagar os seus seguros?
Mas há mais e que também tem origem na má distribuição de renda da
sociedade. A baixa taxa de alfabetização efetiva, o analfabeto funcional, impacta
a contratação de seguros. Grande parte da população de baixa renda não tem
condição de entender as disposições de um contrato simples. Como exigir dela
que entenda um contrato com palavras fora da sua realidade, como prêmio,
sinistro, rateio e outras que são fundamentais para a consolidação da base
teórica do seguro?
Assim, é louvável o desenvolvimento de seguros desenhados para as classes
“D” e “E”. Eles podem fazer diferença na vida de milhões de pessoas, garantindo
uma verba para sua subsistência no caso da falta do arrimo da família ou mesmo
repondo a moradia destruída por um incêndio. Mas é preciso ficar claro que não há
como se pretender uma maior capilaridade do seguro enquanto as classes menos
favorecidas continuarem no atual estágio de desenvolvimento social.