Antonio Penteado Mendonça
Antonio Penteado Mendonça

Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras

ESTATIZARAM O NOVO SEGURO OBRIGATÓRIO

Na semana passada eu escrevi no Estadão, alertando sobre o risco da aprovação do projeto de lei com as regras para o novo seguro obrigatório de acidentes de trânsito. 12 de Abril de 2024

Na semana passada eu escrevi no Estadão, alertando sobre o risco da aprovação do projeto de lei com as regras para o novo seguro obrigatório de acidentes de trânsito. O projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados e agora segue para o Senado.

O novo seguro, que substituirá o antigo DPVAT, desmontado no governo Bolsonaro, se chamará Seguro Obrigatório Para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT). Entre secos e molhados, a redação dada pela lei manteve, em essência, os conceitos básicos do antigo seguro obrigatório, mas introduziu algumas particularidades que fazem o seu funcionamento ser altamente questionável.

Em primeiro lugar, manteve a Caixa Econômica Federal como a gestora do seguro. Acontece que a Caixa não é seguradora. Portanto, de acordo com a lei, não pode operar com seguros.

A Caixa entrou nesta história quando o governo passado decidiu acabar com o DPVAT e tirou da Seguradora Líder a sua gestão. Como alguém teria que fazer essa gestão, já que oficialmente o seguro não tinha acabado, a escolhida, independentemente de ter capacidade para isso, foi a Caixa, o banco público que tem como função precípua o financiamento da moradia popular, ou seja, algo bem diferente de um seguro obrigatório para acidentes de trânsito.

Evidentemente, a coisa funcionou mal e segue funcionando mal. O seguro obrigatório atende vítimas de acidentes de trânsito em todos os rincões do enorme território nacional. A Seguradora Líder tinha uma cobertura territorial que se valia de toda a rede de seguradoras, sendo que os pedidos de indenização e a documentação podiam ser entregues inclusive nas agências bancárias dos bancos com seguradoras participantes do DPVAT. Ou seja, o cidadão brasileiro estava coberto de norte a sul, de leste a oeste e o atendimento era rápido e eficiente. A Caixa não tem esta expertise, nem a rede necessária para fazer o atendimento com a mesma competência. Isso ficou claro desde o momento em que ela, sem estar preparada, se viu com a batata quente na mão. O DPVAT, que funcionava bem, simplesmente não funciona mais tão bem, deixando milhares de pessoas sem receber uma indenização fundamental para a sobrevivência das famílias das vítimas. E não há nada que indique que este cenário vai mudar.

Mas com a nova regra acontece algo desejado pelo governo. O seguro obrigatório de acidentes de trânsito, o novo SPVAT, está, na prática, estatizado. Será administrado pela Caixa, em flagrante violação da obrigatoriedade de ser seguradora para atuar em seguros. Se ele protegerá eficientemente as vítimas de acidentes de trânsito, pagando as indenizações em todo o território nacional sem demora ou burocracia, é um outro problema.

O Brasil tem perto de 400 mil vítimas de acidentes de trânsito por ano, das quais mais ou menos 40 mil morrem. A imensa maioria são pessoas das classes mais pobres da sociedade, ou seja, estamos correndo o risco de piorar um quadro que já está longe de ser bom. E isto é agravado com a destinação de até 40% do faturamento do seguro para os Municípios e os Estados. Seria bom o Senado pensar nisso antes de aprovar a lei.