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CNSeg estima que subvenção ao seguro rural esgote já em agosto

Apenas 20% da área plantada no Brasil está segurada, o que equivale a 13,5 milhões de hectares

Exame - 03 de Agosto de 2023

A proximidade do plantio da safra de verão e a chegada do El Niño — fenômeno climático responsável pelo aquecimento incomum do Oceano Pacífico — têm ampliado a pressão do agronegócio sobre maior suporte do governo federal quanto à subvenção ao seguro rural.

Para este ano, o Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural tem 1,06 bilhão de reais em caixa. Segundo a Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg), o recurso deve se esgotar rapidamente. 'Nossa estimativa é de que até meados de agosto esse recurso já vai estar esgotado. Então, o setor está entrando em fase crítica', afirma Dyogo Oliveira, presidente da entidade.

As consequências se dividem entre os produtores custearem a proteção da lavoura com verba própria ou esperar o governo liberar recurso adicional. 'Isso forma uma fila de espera, o que é ruim até para a programação do próprio produtor rural', diz Oliveira.

Em resposta à EXAME, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) disse estar buscando, em conjunto com a equipe econômica, a suplementação de 1 bilhão de reais para o orçamento de 2023. A movimentação parte de uma demanda da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), endossada pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

'O Mapa, por meio do Departamento de Gestão de Risco, está atento aos efeitos do clima e tem dialogado com os setores de pesquisas e mercado de seguro para adoção de mecanismos que possam mitigar os riscos e aumentar a área segurada no país', afirmou a pasta em nota.

Enquanto entidades pedem complemento de recursos ao Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural, produtores se sentem desestimulados a contratar seguros por causa do alto custo, e os estados buscam alternativas para proteger as lavouras -- e os investimentos.

Qual a importância do seguro rural?

A discussão é importante. Segundo o Atlas do Seguro Rural, que compila dados do setor, a área segurada no país variou de 10% a 20% desde 2019. Desta extensão, 90% correspondem a propriedades de até 170 hectares. Pequenos e médios produtores, portanto, são os maiores contratantes de seguro, exatamente por terem menos área para diversificar os riscos.

Para se ter uma ideia, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) aponta que, em 2021, com um orçamento de 1,15 bilhão de reais, foram segurados mais de 14 milhões de hectares divididos em mais de 120.000 produtores.

Já em 2022, com 1,09 bilhão de reais - isto é, valor próximo ao do ano anterior -, apenas 7,25 milhões de hectares foram protegidos. O motivo: aumento de custos e alta sinistralidade; e o resultado: redução de 35% no número de produtores que acessaram a política pública.

Não por acaso, a CNA solicitou 1 bilhão de reais para a safra 2023/2024 aos ministérios da Fazenda, Agricultura e Orçamento e Planejamento, recurso adicional ao 1,06 bilhão de reais já previsto para esse ano.

O estudo do Climate Policy Initiative, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (CPI/PUC-Rio), que constrói um mapeamento sobre o seguro rural no Brasil, aponta que a Região Sul responde por 60% do número de apólices no país, ante 20% no Centro-Oeste -- maior produtora de grãos.

Contratações e indenizações

Quando se olha a arrecadação proveniente das contratações de seguros, houve crescimento. Segundo a CNSeg, nos cinco primeiros meses do ano de 2023, o seguro rural registrou 5 bilhões de reais em arrecadação, crescimento de 16% em relação ao mesmo período de 2022.

A região do Centro-Oeste detectou um avanço de 25,5% em receita, passando de R$ 1,2 bilhão em 2022 para R$ 1,5 bilhão em 2023, quando considerados os três estados, mais o Distrito Federal.

Goiás liderou as arrecadações da região de janeiro a maio de 2023, com, aproximadamente, R$ 510 milhões e um avanço de 30,2%, seguido por Mato Grosso do Sul, com R$ 493 milhões (+ 6,9%), e Mato Grosso, com R$ 361 milhões (+ 34,7%). O Distrito Federal, por sua vez, foi o que apresentou menor montante, mas o maior crescimento.

Em nível nacional, as indenizações pagas acumularam 2,5 bilhões de reais nos cinco primeiros meses do ano, queda de 67,9% nos pagamentos. A queda se deu porque, no começo de 2022, houve a ocorrência de inúmeros fenômenos climáticos severos no país, como a estiagem no Rio Grande do Sul.

Os números expõem o cenário do setor: aqueles produtores que já contratam o seguro tendem a manter o investimento. No entanto, apesar da expansão da produção de soja e do setor de seguros, o crescimento da cobertura não tem sido proporcional, de acordo com a CPI/PUC-Rio.

Perspectivas pública e privada

Jaime Verruck, secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação do Mato Grosso do Sul, diz que a quantia subvencionada pelo governo federal se mantém no patamar dos 1 bilhão de reais há anos. O problema é que o risco climático aumenta e pressiona o custo da contratação das apólices.

A mentalidade a curto prazo do produtor rural, comenta Verruck, acaba afastando de vez a possibilidade do seguro rural. 'Então não vejo outra forma, se não o governo aumentar o volume de recurso e fazer determinado nível de subvenção ligado à produção. Não me parece que hoje o setor está preparado com margem para cobrir essa estrutura de risco que as mudanças climáticas têm se apresentado', afirma o secretário.

Catia Russo, superintendente de seguros rurais do grupo Mapfre, acredita que a preocupação com o clima tem feito os contratos rurais de seguro aumentarem pouco a pouco. Para a safra 2023/2024 é esperado um aumento nos números de contratações de apólices, visto que “produtores e seguradoras vêm de duas safras de prejuízos”, diz.

“Nós acreditamos que esse seja um mercado em expansão, que ainda tem espaço para um crescimento muito maior”, avalia. Mesmo assim, ela pondera ao dizer que existe um atraso nas contrações da safra de verão 2023/2024, por causa da instabilidade de preço das commodities.

 

Seguro rural nos Estados Unidos: nem lá, nem cá

Não é raro conversar com produtores rurais espalhados pelo Brasil que comparam o seguro rural nacional com o sistema dos Estados Unidos, tido como o maior do mundo. Isso porque, o leque de culturas cobertas é mais extenso e a participação do governo, maior.

Em 2019, foram 153,3 milhões de hectares segurados no país norte-americano, o equivalente a 40% da agropecuária estadunidense, de acordo com a consultoria Agroícone.

O maior número de produtos de seguro possibilitou uma grande popularização do seguro rural no país. Eles vão desde soluções clássicas de indenização por riscos, produtos paramétricos -- apólice voltada os eventos climáticos --, bem como produtos específicos para produtores que adotam algum sistema para conservação do solo.

Na avaliação da Agroícone, o programa de seguros é oneroso ao governo, porque além da subvenção ao prêmio, há subsídio a custos operacionais e administrativos. Ainda assim, o uso de tecnologias por parte dos agricultores e a diversificação de produtos de securitização contribuem para a redução na sinistralidade. Por isso, embora seja oneroso, compensa o investimento frente à possibilidade de quebra da safra.

No Brasil, é isso que se espera: um sistema de seguros mais amplo do ponto de vista de cobertura, com mais subsídios do governo federal e o apoio para recuperar o custo de produção, em caso de sinistro.

Dyogo Oliveira, da CNSeg, afirma que o seguro não é feito pensando na lucratividade, mas em manter a atividade do produtor após uma perda. 'O grande limitador no Brasil é a capacidade de o governo ampliar os recursos para o produtor adquirir o seguro', diz.