Denise Bueno
Denise Bueno

Jornalista especializada na indústria de seguros brasileira e internacional

Governo sanciona lei que regulamenta seguros de cargas

Advogadas do Demarest esperam um debate amplo sobre o tema envolvendo tanto o mercado de transportes como o de seguros 23 de Junho de 2023


O governo federal sancionou a Lei 14.599, que regulamenta os seguros de responsabilidade civil do transportador pela carga, entre outros assuntos. O texto da nova lei foi publicado no Diário Oficial desta terça-feira (dia 20 de junho) e  traz importantes alterações ao alterar o artigo 13 da Lei nº 11.442, criada em 2007.

Conhecida como Lei do Transporte Rodoviário de Cargas, essa lei trata da contratação de seguros pelos embarcadores e transportadores e teve origem no Projeto de Lei Conversão de nº 10/2023, resultado da tramitação da Medida Provisória nº 1.1153/2022. Com as novas regras, os caminhoneiros autônomos e as transportadoras poderão contratar o próprio seguro de carga, o que antes era feito diretamente pelas empresas contratantes.

Na análise das advogadas Camila Prado e Márcia Cicarelli, sócias da área de Seguros, Resseguros, Previdência Privada e Saúde Suplementar do Demarest Advogados, por trazer importantes alterações aos seguros de transportes, se espera “um debate amplo sobre o tema envolvendo tanto o mercado de transportes como o de seguros, especialmente sobre a nova dinâmica das contratações e sobre os impactos práticos na contratação dos planos de gerenciamento de riscos e nas cartas DDR (Dispensa do Direito de Regresso)”.

Alan Medeiros, assessor institucional da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), informou ao Infomoney que considera que as novas regras vão ser melhores para transportador, que antes tinham que se submeter às regras definidas entre o dono da carga e a seguradora.

Ele explica que no transporte de cargas diferentes, o transportador tinha um planos distintos de gerenciamento. “Na prática, o plano de gerenciamento ‘a’ permitia ao motorista parar em um ponto e o plano ‘b’ dizia que não podia parar ali porque era perigoso. Se o transportador optou por parar no ponto ‘a’, em Minas Gerais, por exemplo, e lá na frente, no Paraná, houvesse um acidente, a seguradora pagava o valor para transportadora e entrava com pedido de regresso para o transportador, alegando que ele descumpriu uma das regras. A partir de agora vai fazer só um registro, vai ter autonomia para seguir o que determina o Código Brasileiro de Trânsito”, explica Medeiros.

De acordo com entrevista de Marcelo Rodrigues, diretor da NTC&Logística, ao Infomoney, desde 2007, quando foi promulgada a Lei 11.442 para a regulamentação do seguros de transporte, foi permitido que o embarcador contratasse em nome do transportador as apólices de seguro de responsabilidade do transportador.

Entre as principais alterações previstas na nova lei, as especialistas do Demarest destacam em nota enviada ao Sonho Seguro:

  • Alteração dos seguros obrigatórios (art. 13, incisos I, II e III, e § 8º)

De acordo com a norma, são de contratação obrigatória dos transportadores os seguros de responsabilidade civil do transportador rodoviário carga (RCTR-C), desaparecimento de carga (RC-DC) e responsabilidade civil de veículo utilizado em transporte de cargas por danos a terceiros (RCV). A novidade é que, antes, os seguros de RC-DC e RCV eram facultativos.

Além disso, a Lei dispõe como facultativo o seguro de transporte nacional contratado pelo proprietário da mercadoria transportada. Embora a nova lei não contenha previsão expressa sobre a revogação do artigo 20, ‘h’, do Decreto-Lei 73/66 que previa que tal contratação era obrigatória, entende-se que houve uma revogação tácita. Tal revogação, porém, pode ser passível de questionamento, pois há entendimentos no sentido de que o DL 73/66 tem status de lei complementar e , portanto, não pode ser alterado por lei ordinária, hierarquicamente inferior.

  • Contratação do RCTR-C por estipulação mantida (art. 13, caput)

Outro tema que gerou muito debate na vigência da MP 1.153 é a contratação do seguro RCTR-C por estipulação pelo embarcador da mercadoria, ao invés do transportador.  

“A Lei publicada dá tratamento diferente daquele originariamente previsto na MP 1153, que falava emcontratação exclusiva pelo transportador e vedava, portanto, a contratação por estipulação pelo embarcador (prática constante na vigência da Lei 11.442/2007). A nova norma, por outro lado, prevê que os seguros de responsabilidade civil do transportador são de contratação obrigatória, e não exclusiva dos transportadores, indicando a possibilidade de contratação por estipulação”, avaliam as advogadas do Demarest.  

  • Planos de gerenciamento de risco (art. 13, §1º)

Os planos de gerenciamento de risco (PGR) são um conjunto de previsões de prevenção de acidentes e roubos para os transportes de carga, muito comuns nos seguros de transportes e associados a cláusulas de dispensa de direito de regresso (DDR) pelas seguradoras dos embarcadores.

Na vigência da Lei nº 11.442/2007, o cumprimento do PGR era condição para que a seguradora do embarcador não exercesse o direito de regresso contra o transportador em caso de desaparecimento da carga. Assim, a DDR era um benefício aos transportadores que cumpriam o PGR justamente porque o escopo do PGR é reduzir o número de sinistros e mitigar os prejuízos.

“Pela nova Lei, o PGR está mantido. Neste contexto, a norma sancionada dispõe que os seguros de responsabilidade civil por danos à carga (RCTR-C), desaparecimento e roubo (antigo RCF-DC) devem estar vinculados a um PGR estabelecido de comum acordo entre o transportador e sua seguradora. Desta forma, o PGR passará a estar associado ao seguro de responsabilidade do transportador, ao contrário da prática anterior de mercado, que o vinculava às DDR do seguro do embarcador”, completam as especialistas na área de Seguros do Demarest.

A Lei também dispõe que o contratante do serviço do transporte poderá exigir medidas adicionais de segurança daquelas previstas no Plano de Gerenciamento de Risco vinculado aos seguros RC do transportador, mas os custos associados a sua implementação deverão ser suportados pelo próprio contratante e não pelo transportador.

Houve uma mudança com relação ao texto da MP 1153, que previa restrições à vinculação do PGR a seguros contratados pelo contratante do serviço dos transportes com relação às coberturas já contidas no seguro de responsabilidade civil do transportador.