Gastos com Bets ultrapassam seguros no Brasil
Setor reage melhorando a comunicação e ampliando as ações focadas em educação financeira
Valor Econômico - 14 de Maio de 2025Depois dos brasileiros gastarem com as bets mais que o dobro
do que destinaram a pagamentos de seguros do tipo Vida e Automóveis em 2024, o
setor de seguros admite que precisa melhorar sua comunicação com a população e
ampliar as ações focadas em educação financeira.
“Quando vemos o volume da renda do cidadão gasto com
apostas, cabe a nós o questionamento: por que essas pessoas não estão
direcionando esses valores para os bons instrumentos disponíveis e que, de
fato, vão protegê-lo? O setor tem um desafio de entender esse cenário”, pontuou
Júlia Normande Lins, diretora da Superintendência de Seguros Privados (Susep),
durante a 12ª Semana Nacional de Educação Financeira (Semana Enef).
De acordo com dados da Confederação Nacional do Comércio de
Bens, Serviços e Turismo (CNC), os gastos com apostas on-line foi de R$ 240
bilhões em 2024. No mesmo período, um estudo elaborado pela Federação Nacional
de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), com base nas informações da
Superintendência de Seguros Privados (Susep), revela que o setor de seguros
arrecadou R$ 72,7 bilhões em prêmios (quantia que as pessoas pagam regularmente
às seguradoras para manter suas apólices e certificados ativos).
Conforme dados do Banco Central, o público acima dos 60 anos
no Brasil gastou mais de R$ 3 mil mensais com apostas em 2024. Para Ângela
Beatriz de Assis, vice-presidente da Fenaprevi, a disposição para tamanho gasto
evidencia que a noção de curto prazo é muito mais forte e essa cultura
compromete o presente e o planejamento de longo prazo.
“Sabemos que 65% dos brasileiros pensam em se planejar para
o futuro, mas dizem que não conseguem guardar dinheiro. O que muitos não
percebem é que o valor de apenas um mês de apostas, dividido ao longo do ano,
ou seja, R$ 250, se aplicados durante 30 anos vão gerar uma boa complementação
de renda”, explica. “Precisamos falar mais sobre a importância dele pensar no
futuro com esse brasileiro que está envelhecendo e vivendo mais',
complementa.
A regulação do setor de apostas esportivas foi sancionada no
fim de 2024 e começou a vigorar em janeiro deste ano. As estimativas mais
recentes do BC indicam que entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões por mês foram
movimentados em apostas on-line nos três primeiros meses de 2025.
Seguros com foco em baixa renda e trabalhadores autônomos
Os temas de planejamento financeiro e investimentos em
previdência são os mais abordados pelas 73 empresas supervisionadas pela Susep
para a promoção da educação financeira. A criação de sites e plataformas é a
iniciativa mais comum (21%), seguida por materiais educativos (16%) e campanhas
educacionais. O foco da indústria tem sido os adultos de 20 a 59 anos.
Os dados, diz Lins, demonstram que há um esforço do setor de
tornar as informações mais disponíveis, mas o acesso aos produtos precisa
avançar na mesma medida, especialmente nos núcleos populacionais de mais baixa
renda e de maiores níveis de informalidade.
“Se trabalhamos para educar as pessoas de baixa renda, mas
elas não conseguem contratar os produtos que temos hoje, há uma frustração.
Também é preciso reconhecer que essas pessoas nem sempre têm a melhor
experiência com os produtos contratados, pois a expectativa de indenização é
diferente. São inúmeras situações singulares que desafiam o regulador”,
comenta.
Para a Fenaprevi, a oferta de produtos alinhados à nova
realidade geracional e de emprego e renda é o principal passo que a indústria
de seguros precisa dar.
Seguros voltados para motoboys é um exemplo de produtos que
precisam ser desenvolvidos diante das novas configurações de trabalho, destaca
a Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg).
“A moto usada para o trabalho, muitas vezes, é comprada de
forma parcelada. A perda desse bem afeta o sustento da família e gera
inadimplência. Para quem tem menos renda, menos poupança e menos resiliência
financeira, o seguro se mostra ainda mais necessário. No final, não é sobre
quanto se paga, mas o que se garante a partir do seguro”, sustenta Ney Ferraz
Dias, presidente da FenSeg.
A entidade estima que entre 1,6 e 1,7 milhão de motos são
seguradas, número pequeno diante da frota em circulação (34,4 milhões em 2024).
Emerson Del Re, vice-presidente da Comissão de Seguros
Gerais Afinidades da FenSeg, também destaca o apelo dos seguros residenciais
junto aos donos de pequenos negócios. “Para o empreendedor de baixa renda, o
seguro residencial é um investimento no próprio negócio. É um seguro com preços
atrativos, com inúmeros serviços agregados, como encanador e eletricista, e que
permite continuar produzindo”.
A Susep prevê para o final do ano a publicação de um
relatório com os aprendizados obtidos no desenvolvimento de diferentes
linguagens e modelos de seguros testados no Sandbox, o ambiente regulatório
experimental que incentiva a implantação de projetos inovadores. Os testes, sob
a supervisão da Susep, são focados em novos produtos, serviços ou novas formas
de prestar serviços tradicionais. Ao todo, foram avaliados 11 projetos no
primeiro edital do Sandbox e 21 no segundo. Uma terceira edição foi anunciada em
2024.