Governo estuda MP para criar o ‘open health’
Abramge alerta para informações médicas fragmentadas por falta de um prontuário único
Valor Econômico - 19 de Janeiro de 2022Governo estuda MP para criar o ‘open health’
Com a intenção de ampliar a concorrência no mercado de
planos de saúde, o governo estuda editar uma medida provisória ainda neste ano
para criar um sistema de “open health”, inspirado na plataforma de “open
banking”, sistema idealizado pelo Banco Central para dar maior transparência ao
setor bancário.
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse ao Valor que a
ideia nasceu de conversas com o presidente do Banco Central, Roberto Campos
Neto. O ministro também informou que recebeu o aval do presidente Jair
Bolsonaro, nas últimas semanas, para implementar o plano no país.
A medida ainda vem sendo gestada em Brasília, mas a ideia
central é que, a exemplo do que vem sendo implantado por etapas no país com os
bancos, haja maior transparência no setor de planos de saúde. E que seja criado
um grande registro nacional de dados sobre pacientes e indicadores sobre saúde
suplementar a ser compartilhado entre operadoras e pacientes.
Segundo Queiroga, o compartilhamento de dados de clientes,
por meio da plataforma de “open health”, pode levar uma operadora nova ou já
atuante no mercado, por exemplo, a oferecer um plano mais barato para um
paciente que eventualmente use pouco hospitais ou outros serviços de saúde.
“Conversando com o Campos Neto, dissemos: vamos criar o ‘open
health’. Por que a gente não usa uma plataforma como o ‘open banking’ pra
facilitar a portabilidade? Sabe quanto tempo demora a portabilidade [para um
beneficiário mudar de um plano de saúde para outro] hoje? Cerca de 90 dias. Aí
imagina numa plataforma como essa, em que você bota o CPF, aí aparece o seu
plano e vários outros planos se encaixam no seu perfil e você aperta em cima [na
tela do celular] e muda”, disse o ministro.
Queiroga ainda entende que se houver mais competição e
oferta de planos de saúde, o Sistema único de Saúde (SUS) pode deixar de ficar
sobrecarregado e parte de seu público migrar para o setor privado.
O “open health” é inspirado em modelo adotado no mercado de
saúde da Austrália e seu conceito já está inserido nas diretrizes gerais aprovadas
pelo Conselho Nacional de Saúde Suplementar (Consu), no fim do ano passado, no
sentido de incentivar maior oferta de serviços de saúde, estimular o surgimento
de mais operadoras e reduzir preços praticados nesse mercado.
O Consu, por sua vez, é um órgão colegiado formado pelos
ministros Queiroga, Paulo Guedes (Economia), Anderson Torres (Justiça e
Segurança Pública) e Ciro Nogueira (Casa Civil). O “open banking”, por sua vez,
é uma espécie de sistema aberto criado pelo BC que permite que clientes compartilhem
suas informações bancárias com instituições já autorizadas a operar pela
própria autoridade monetária. Caso o cliente permita o compartilhamento, as
instituições se conectam umas às plataformas das outras. O objetivo é que elas
possam usar essas informações para oferecer a esse mesmo cliente produtos e
serviços financeiros em condições mais vantajosas para ele. No início deste
ano, o “open banking” entrou em sua quarta e última fase.
Na avaliação da atual administração da pasta da Saúde, há
espaço para a entrada de mais empresas no segmento de saúde suplementar, uma
vez que no início dos anos 2000, logo quando foi criada a Agência Nacional de
Saúde Suplementar (ANS), as operadoras de planos de saúde somavam mais de 2 mil
atuando no país.
Na edição da segunda-feira desta semana, o Valor mostrou
estudo do Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade) que aponta
que o número de operadoras de planos de saúde caiu 47% entre 2011 e 2020. Essa
tendência de concentração de mercado ao longo da última década vem sendo criticada
por ministros do governo.
Presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde
(Abramge), Renato Casarotti diz que tem acompanhado as falas do ministro da
Saúde sobre os benefícios do “open health”, em eventos públicos do setor. A
entidade, porém, ainda não foi convocada para uma reunião específica sobre o
tema.
“A ideia é boa, conversa muito com esse momento em que
estamos falando de Lei Geral de Proteção de Dados, de as informações serem do
titular. A lógica faz bastante sentido”, diz Casarotti. “O importante é
entender como isso se encaixa no setor de saúde, que é um pouco diferente do
setor bancário.”
De acordo com ele, há duas questões principais que tendem a
limitar em algum nível os impactos da proposta do governo federal. A primeira é
que as informações médicas sobre os pacientes ainda são “muito fragmentadas” no
Brasil, sem a existência de um prontuário único. “No setor de saúde, há dados
com os médicos, hospitais, laboratórios, operadoras, que ainda não se falam”,
diz o presidente da Abramge. “Se o prontuário único estivesse funcionando, aí o
‘open health’ faria todo o sentido.