Segunda onda e impactos da pandemia orientam desafios da saúde em 2021
Ano começa com custos em alta e incertezas sobre a demanda assistencial. Telessaúde é boa notícia
Ideia e Conteúdo / Sindseg SP - 28 de Abril de 2021Enquanto ainda enfrentam a emergência, gestores de saúde projetam as dificuldades com os custos de 2021 influenciados pela segunda onda e impactos
ainda pouco mensurados da pandemia sobre a demanda assistencial. “Teremos um
ano complexo, um ano difícil”, diz Samuel Flam, diretor-presidente da Unimed-BH.
De acordo com o estudo “Global Medical Trends”, da Willis
Towers Watson, a previsão de inflação médica para a América Latina é de 13,6%
este ano. “No Brasil, a taxa média deve ficar em torno de 11,21%”, estima
Walderez Fogarolli, diretora de gestão de saúde da Willis Towers Watson. O que
se mediu até agora aponta para bem alto.
A Planisa, consultoria em gestão de saúde, comparou o
primeiro trimestre de 2021 com o mesmo período do ano passado e registrou alta
de 60% nos custos no atendimento de pronto-socorro, mais de 30% na diária de
UTI e assim por diante em quase todos os itens de produção para os hospitais.
“Movimento impulsionado principalmente pela inflação de EPIs e de medicamentos”,
explica Marcelo Carnielo, diretor técnico da empresa, destacando a segunda onda
como fator fundamental. “O primeiro trimestre deste ano será o de maior custo
com assistência”, completa Vera Valente, diretora executiva da FenaSaúde.
A saúde teve um ano atípico em 2020, com o adiamento de
grande parte dos procedimentos que normalmente seriam realizados. Um
levantamento da Mercer Marsh em universo de 700 empresas e 2 milhões de
usuários de planos de saúde apontou redução de 19% nas internações e 25% nos
atendimentos no pronto-socorro.
Este ano, ao contrário, deve ser de custos e volume
assistencial juntos nas alturas com o desrepresamento de procedimentos
não-covid. O número de autorizações para exames e terapias emitidas pelas
operadoras, por exemplo, subiu 37,1% em março de 2021 em comparação ao primeiro
mês da pandemia.
Outro indicador nesse sentido são os atendimentos em
pronto-socorro que não geraram internação. Em abril de 2020, a taxa desses
procedimentos baixou a 43% do total realizado em fevereiro de 2020 (última
referência pré-covid). Em março deste ano já estava em 93,2%, segundo a ANS.
Com isso, em março de 2021 os planos de saúde observaram a
maior despesa assistencial na comparação com os doze meses anteriores e um
valor aproximadamente 30% superior ao de fevereiro de 2020. Um aumento, aliás,
registrado mesmo com a sinistralidade do primeiro trimestre ainda abaixo da
média histórica.
Já no dia seguinte ao primeiro trimestre de altas
generalizadas, em 01/04, o Rol de Procedimentos foi atualizado com 69 novos
itens entre exames, terapias, cirurgias e novos medicamentos, 19 deles de
combate ao câncer, ampliando a lista de remédios oncológicos cobertos pelos
planos de saúde para 58. A ANS estima impacto de R$ 1,52 bilhão a R$ 2,41
bilhões nas despesas assistenciais das operadoras.
A tudo isso junta-se um risco ainda desconhecido. “Não
sabemos qual será a condição de saúde dos recuperados da Covid nos próximos
anos”, alerta Nilton Molina, presidente do Instituto de Longevidade MAG. Hoje,
eles são 12,5 milhões e aumentam em um ritmo de quase 100 mil por dia. É
possível que ainda este ano representem o equivalente a toda a carteira da
saúde suplementar.
Segundo estudo publicado pela Lancet com 1.733 pacientes que
receberam alta entre 7 de janeiro de 2020 e 29 de maio de 2020, em Wuhan, na
China, após seis meses mais de 70% deles ainda relatavam pelo menos um sintoma
da doença, principalmente fadiga muscular, dificuldades para dormir, ansiedade
e depressão. Aqueles que enfrentaram quadros mais graves continuaram sofrendo
com problemas respiratórios severos.
“Os estudos relataram que os pacientes com COVID-19 e alta
hospitalar podem ter sintomas persistentes, padrões anormais nas manifestações
de imagem do tórax, função pulmonar prejudicada e baixa qualidade de vida”,
resume o documento. Não se sabe, portanto, qual será o impacto desse fenômeno
na demanda assistencial nos próximos anos.
Da mesma maneira, o que pode significar para o esforço de
prevenção e controle da sinistralidade, considerando também todos os
recuperados que não chegaram ao hospital. E, ainda, como esse quadro pode ser
agravado por pacientes que não trataram doenças crônicas durante a pandemia e
por casos ambulatoriais que evoluíram para média e alta complexidades.
Para completar, uma pesquisa da Fundação Dom Cabral (FDC) e
Talenses Group mostra que a pandemia prejudicou a saúde mental de 73,8% dos
mais de 500 profissionais entrevistados pelo estudo, demonstrando que o cenário
se tornou um tema urgente.
“A interrogação é o que vem pela frente. É possível que o
tratamento das sequelas tenha um custo maior do que o do enfrentamento da
pandemia”, diz Marcelo Carnielo, da
Planisa.
Telessaúde
A boa notícia no meio do furacão é a telessaúde, com números
expressivos e em alta que sugerem demanda represada menor do que a esperada. E
que a tendência pode reduzir a conta nos próximos anos.
Levantamento da FenaSaúde mostrou 2,6 milhões de
atendimentos on-line no país entre fevereiro de 2020 e janeiro deste ano. Do
total, 60% foram para urgências e 40% para casos eletivos, mostrando como a
telessaúde se tornou uma solução inclusive para casos graves. Mais de 80% dos
pacientes tiveram suas necessidades atendidas de forma remota. Antes da
pandemia, praticamente não ocorriam atendimentos nesse formato.
Futuro
“Atualmente a saúde é cara e não recebemos necessariamente
qualidade e resolutividade em troca do preço que pagamos”, diz Marcelo
Carnielo. Está claro, ele continua, que há muita ineficiência e desperdício
durante o trajeto do paciente no sistema. O Impacto disso é muito severo nas
contas, diz, sobretudo quando chega ao hospital - “onde tudo é muito caro”.
“Em toda a cadeia de serviços de saúde há consenso quanto à
necessidade de mudanças. A pressão dos custos sufoca todos e penaliza,
sobretudo, quem mais precisa de assistência”, diz Vera Valente, da FenaSaúde.
A telessaúde é um exemplo de inovação que aponta para uma
assistência de alta performance, com soluções que permitam fazer mais com
menos. Kenneth Almeida, diretor do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, diz que a
pandemia acelerou muito esse processo. “A urgência faz as coisas acontecerem
mais rapidamente”.
Marcelo Carnielo também destaca a necessidade de mais
interação entre público e privado e aperfeiçoamento nos modelos de remuneração.
“O SUS e a saúde suplementar precisam ser realmente complementares”, avalia.
“As associadas da FenaSaúde têm buscado atuar em iniciativas
que garantam maior resolutividade, com melhores resultados para os
beneficiários a custos compatíveis. Um sistema equilibrado permite mais
possibilidades de tratamento e cura, com custos mais racionais – portanto, com
menor impacto financeiro sobre o bolso dos clientes”, finaliza Vera Valente.