Abalo na saúde mental é tema urgente nas empresas
A pandemia prejudicou a saúde mental de 73,8% dos mais de 500 profissionais entrevistados em uma pesquisa da Fundação Dom Cabral (FDC) e Talenses Group, registra o Valor Econômico. Entre os pesquisados, 53% conhecem alguém que tenha sofrido burnout - um estado de estresse crônico causado pelo trabalho que leva à exaustão física e emocional. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que o Brasil é o país mais ansioso do mundo e o quinto mais depressivo. “Com esse cenário, entendemos a necessidade urgente de discutirmos o papel das organizações sobre o tema e as ações necessárias em prol da saúde mental dos colaboradores”, diz Carlo Pereira, diretor-executivo da Rede Brasil do Pacto Global da ONU.
Para Paul Ferreira, professor de gestão estratégica e
diretor do Centro de Liderança da FDC, a saúde mental nas empresas foi agravada
com a fadiga extrema provocada pela pandemia. Ferreira, que coordenou a
pesquisa citada no começo desta reportagem, comenta sobre um estudo de 2019 da
Internacional Stress Management Association com nove países que mostrou o
Brasil no segundo lugar em nível de estresse no ambiente de trabalho, ficando
atrás somente do Japão.
Na visão de Ferreira, quatro principais fatores levam a esse
cenário: excesso de trabalho, subutilização de propósito, liderança autoritária
e ambiente e contexto de trabalho inadequados. “Outro ponto de tensão que pode
levar ao burnout relaciona-se com a questão infindável sobre como equilibrar
trabalho e vida pessoal e seus profundos impactos no bem-estar.”
Depressão e ansiedade custam US$ 1 trilhão à economia global
por ano, segundo a OMS, ocasionando perda de produtividade e competitividade
para as empresas. “As lideranças executivas começaram a entender a importância
de cuidar de pessoas para manter a sustentabilidade de seus negócios,
integrando o tema saúde mental à pauta da gestão estratégica das empresas”, diz
o diretor da Rede Brasil do Pacto Global da ONU. “A pandemia deixou clara a
necessidade de as empresas repensarem seus programas de saúde mental e
bem-estar”, diz. “Mesmo em empresas com iniciativas robustas e estruturadas,
ouvimos relatos de aumento significativo no estresse geral dos times.”
Para Lisiane Bizarro, da Sociedade Brasileira de Psicologia,
as mudanças no trabalho, na sociedade, na economia e no meio ambiente que
vinham sendo sinalizadas há alguns anos foram precipitadas no contexto da
pandemia. “O tipo de trabalho, suas condições e a conciliação com as mudanças
na vida pessoal trouxeram muitos desafios”, afirma. “Isso sensibilizou as
pessoas para olharem para quem está presente em todas essas mudanças e nas
consequências que elas terão: o ser humano.”
Para ela, a organização do trabalho, condições inadequadas,
o assédio moral, o burnout e o sentido do trabalho são fatores que influenciam a
saúde física e mental dos trabalhadores. Segundo ela, a prevenção dos fatores
de risco psicossociais no trabalho obriga a um envolvimento ativo e dinâmico da
organização e dos trabalhadores
O médico Leandro Pereira Garcia, gerente médico sênior de
gestão de saúde populacional na Amil/UHG, observa que, para as empresas, o
impacto da deterioração da condição mental da população se dá em várias
frentes, como o aumento dos custos diretos em saúde e a queda na produtividade
em função do absenteísmo e do presenteísmo (quando o colaborador está na empresa
mas não consegue desenvolver o trabalho de forma adequada).
“Estima-se que, nesta década, depressão será a principal
causa de absenteísmo”, diz Garcia. “A queda na produtividade reflete em um pior
desempenho econômico, que realimenta o ciclo. Assim, falar de saúde mental nas
empresas hoje é urgente, por uma questão humanitária, por uma questão
competitiva e para auxiliar na recuperação econômica do mercado em que elas
mesmas estão inseridas.