Hapvida e Intermédica acertam fusão e criam grupo de R$ 110,5 bi
A empresa combinada passa a ter 13,6 milhões de usuários de planos de saúde e dental e uma receita líquida de R$ 18,2 bilhões
Valor Econômico - 01 de Março de 2021O Valor Econômico relata que, após um mês e 20 dias de negociações, as duas maiores operadoras de planos de saúde do país, Hapvida e Grupo NotreDame Intermédica (GNDI), concluíram na noite de sábado o acordo de fusão que cria uma companhia com valor de mercado de R$ 110,5 bilhões. Trata-se da décima primeira empresa mais valiosa da B3, considerando as cotações das duas companhias na sexta-feira. A empresa combinada passa a ter 13,6 milhões de usuários de planos de saúde e dental e uma receita líquida de R$ 18,2 bilhões, o que a coloca como uma das maiores operadoras de saúde verticalizadas do mundo.
A NotreDame Intermédica conseguiu
aprovar seus principais pleitos, que eram aumentar o prêmio de 10% para 15% e
ter uma gestão compartilhada, com dois CEOs. Cada acionista da Intermédica vai
receber 5,249 ações de Hapvida mais R$ 6,45. Outra demanda da Intermédica
atendida foi o pagamento de R$ 4 bilhões em dividendos.
Assim, a companhia combinada passa a ter
53,6% de ações da Hapvida e 46,4% da GNDI. A família Pinheiro, controladora da
Hapvida, seguirá sendo a maior acionista, com posição de 37,6%. A Bain Capital,
maior acionista da Intermédica com 11,2%, reduz sua participação para 5,2%,
podendo se desfazer dessa fatia residual na bolsa.
A transação foi fechada relativamente
rápido, mas as duas operadoras já vinham conversando, informalmente, há cerca
de um ano sobre a possibilidade de se juntaram, uma vez que têm um perfil
semelhante. Ambas comercializam planos de saúde para a base da pirâmide, contam
com uma ampla rede verticalizada e não há praticamente sobreposições de praças
de atuação. A Hapvida é líder no Norte e Nordeste e a Intermédica, no Sudeste,
em especial em São Paulo.
A primeira investida formal partiu da
Hapvida — incentivada por bancos — que enviou uma proposta ao conselho da GNDI
em 22 de dezembro, mas as negociações efetivas só começaram em 8 de janeiro,
após a proposta ter se tornado pública. A partir daí, a Intermédica contratou
os bancos Citi e JP Morgan e o escritório Souza, Mello e Torres Sociedade de
Advogados. O Itaú BBA, que normalmente trabalha com a Intermédica, mudou de
lado na fusão com a Hapvida. A operadora do Ceará contratou o banco preferido
da concorrente para facilitar a interlocução entre as companhias.
O relacionamento entre GNDI e BTG, banco
que assessorou a Hapvida, não é boa, o que dificultaria o processo, contou uma
fonte. O que impulsionou a Hapvida a fazer uma proposta formal no fim do ano
foi a oferta subsequente de ações (follow-on) da Bain Capital, maior acionista
da Intermédica, realizada no começo de dezembro, que reduziu a fatia da gestora
de private equity para cerca de 11%. A Bain era contra a fusão, mas com uma
participação menor, a Hapvida enxergou uma possibilidade das discussões
avançarem.
No acordo fechado neste fim de semana,
não houve alteração na distribuição do conselho de administração em relação à
proposta original. A Hapvida terá cinco assentos, ficando com o direito de
indicação do chairman. A Intermédica terá dois assentos, um deles ocupado por
Irlau Machado, atual CEO da empresa, e o conselho terá ainda dois membros
independentes. Machado será co-CEO da companhia resultante, com Jorge Pinheiro,
filho do fundador da Hapvida. Não há uma amarração contratual de quanto tempo a
companhia seguirá com a estrutura de co-CEOs.
Outros membros da diretoria da
Intermédica também já estão confirmados na composição da nova Hapvida – como
Marcelo Moreira Marques, diretor financeiro, e Pedro Calandrino, diretor de
fusões e aquisições (M&A). A companhia também vai adotar alguns comitês que
a Intermédica tinha, e a Hapvida não. Não houve sequer uma reunião presencial.
A fusão que forma a gigante de saúde foi toda remota. Os encontros foram pelo
Zoom — a Bain a partir de Boston, Hapvida entre Fortaleza e São Paulo, e
Intermédica em São Paulo.
Logo após a proposta de fusão ter se
tornado pública, em janeiro, as ações das companhias dispararam e as operadoras
chegaram a ganhar R$ 32,5 bilhões em valor de mercado em apenas dois pregões.
Essa forte valorização foi vista como uma aprovação do mercado para o negócio.
Segundo especialistas, são pequenas as chances de o Conselho Administrativo de
Defesa Econômica (Cade) reprovar o negócio porque quase não há sobreposição nas
cidades em que atuam, sendo que a única dúvida é em relação a Joinville (SC).
Com a união, Hapvida e Intermédica ficam isoladas em primeiro lugar no mercado
brasileiro de convênios médicos, distantes da segundo colocada Bradesco Saúde.
O novo grupo também se aproxima da maior do setor de planos odontológicos,
OdontoPrev.
A companhia combinada passa a deter uma
carteira com 8,4 milhões de usuários de planos de saúde. A Bradesco Saúde tem
3,3 milhões. Na sequência, vem Amil com 2,9 milhões de usuários de saúde e 2,21
milhões de clientes de planos dentais. A SulAmérica, por sua vez, conta com 2,2
milhões de usuários de convênio médico e 1,7 milhão no segmento odontológico.
Na área dental, Hapvida e Intermédica contam com 5,1 milhões de usuários, ainda
atrás da OdontoPrev, que tem 7,3 milhões. Os números consideram os dados do
terceiro trimestre.
Mas a concorrência se dará mesmo com as
Unimeds, que dominam várias praças e têm cerca de um terço do mercado de planos
de saúde. A gestão das cooperativas médicas é descentralizada e em vários casos
pouco profissionalizada. Levantamento feito pelo próprio setor de cooperativas
médicas mostra que das 345 Unimeds existentes no país, 26 serão afetadas pela
fusão entre Hapvida e Intermédica.
As duas companhias já falaram claramente
que pretendem entrar nas cidades dominadas pelas Unimeds, que estão analisando
a possibilidade de construir mais rede própria para oferecer planos mais em
conta. Mas não é uma iniciativa simples, uma vez que Hapvida e Intermédica têm
juntas 84 hospitais, 280 clínicas e 257 unidades de medicina diagnóstica no
país.
Esse modelo verticalizado é o que mais
cresce no mercado de planos de saúde, por permitir um controle maior dos
custos.
O setor vem perdendo usuários devido à
crise econômica e aumento do desemprego, já que a maior parte dos beneficiários
utiliza planos corporativos, pagos por seus empregadores. Entre março de 2016 e
setembro do ano passado, no entanto, Hapvida e Intermédica acrescentaram a suas
carteiras 2,3 milhões de pessoas. Além disso, as duas companhias vêm investindo
pesadamente em aquisições. Somente no ano passado, destinaram mais de R$ 4
bilhões na compra de operadoras concorrentes, hospitais, clínicas e
laboratórios. As duas operadoras se capitalizaram na abertura de capital em
2018 e com novas captações no mercado.
Para os concorrentes, podem surgir oportunidades
de aquisições. Enquanto durar a análise do Cade, as duas operadoras não devem
promover novas compras. No último ano, os múltiplos das transações dispararam,
com ativos sendo adquiridos por até 27 vezes o lucro antes de juros, impostos,
depreciação e amortização (Ebitda). O aumento expressivo dos múltiplos e
concorrência pelos mesmos ativos, mais recentemente, também foi uma razão para
a combinação dos negócios.
Os assessores financeiros da Intermédica
foram Citi e JP Morgan, com assessoria jurídica do Souza, Mello e Torres. Na
Hapvida, foram os bancos BTG Pactual e Itaú BBA e os escritórios Madrona e
Pinheiro Neto.