home / notícias / Seguro agrícola aprofunda raízes no campo

Seguro agrícola aprofunda raízes no campo

"O seguro rural é importante para dar equilíbrio tanto econômico quanto emocional ao produtor, sempre sujeito a esse risco climático".

Jornal do Comercio (RS) - 18 de Novembro de 2020

É, certamente, o agronegócio uma das grandes fontes de crescimento do setor de seguros no ciclo 2019/2020. Em um ano no qual a colheita de grãos no Brasil foi recorde, assim como preços e desafios climáticos, a demanda pelo seguro rural deu um salto. No Rio Grande do Sul, as perdas com a estiagem passada e o temor com o verão 2021 adubaram a procura, já que o risco de déficit de chuva ronda novamente Estado.

O La Niña é a maior ameaça no horizonte dos milhões de hectares que estão sendo semeados. Os gaúchos que perderam parte do que plantaram em 2019, e não foram poucos, ampliaram significativamente a busca por este serviço. Com o aumento substancial do valor destinado pelo governo federal para a subvenção, de R$ 440 milhões no ano passado para próximo de R$ 900 milhões neste ano, a contratação do seguro acelerou junto com plantadeiras e colheitadeiras.

Coordenador da Comissão de Crédito Rural e Seguro Agrícola da Federação da Agricultura do Estado (Farsul), Elmar Konrad destaca que a proteção financeira foi fundamental não apenas para o produtor. Também foi decisiva para a economia de muitos municípios e do Estado como um todo. De 19,5 milhões de toneladas de soja previstas para o ciclo 2019/2020, o Rio Grande do Sul terminou ensacando e embarcando em contêineres não mais do que 11 milhões de toneladas - o restante foi dizimado pela estiagem, resultando em menos recursos no bolso do produtor e nos cofres públicos.

O baque só não foi maior pelos bons preços pagos na soja, no milho e no arroz - mas boa parte também já havia sido comercializada anteriormente, em cotações menores. Sem receber ao menos uma parcela do que perderam para a estiagem, por meio do seguro agrícola, muitos produtores deixariam de pagar suas contas. E outros nem mesmo teriam condições de voltar a semear uma nova safra, já que o prejuízo foi grande.

A relevância do seguro agrícola para manter o produtor na atividade e a economia regional como um todo encontra eco na história recente de agricultores como Antonio Rizzardi, 43 anos. Ele semeou 2,5 mil hectares entre São Nicolau, São Borja e Cruz Alta. A expectativa de produzir uma média de até 55 sacos de soja por hectare foi desidratada pela falta de chuva. Em algumas áreas, reduzindo a produtividade para até duas sacas, em outras, alcançou no máximo 20 sacas.

Nas áreas não financiadas com recursos públicos, Rizzardi optou por complementar com seguro particular, garantindo 90% da área coberta. Mas destaca que a opção é sempre um paliativo e não cobre 100% do prejuízo. Como o cálculo é sobre um percentual limitado sobre o número de sacas por hectares, e calculado com um preço fixo, por exemplo, não garantiu os bons preços atuais da soja para compensar plenamente os danos.

'Uso o seguro há uns 10 anos, mas fazia tempo que não acionava. Não tive um retorno de tudo que gastei com maquinário, insumo e pessoal, mas consegui manter a estrutura e plantar de novo neste ano. É pelo fôlego, já que não supre todas as necessidades e prejuízos', alerta Rizzardi.

O produtor ainda destaca que existem diferentes modalidades de seguro, sendo necessário estudar bem qual a melhor opção para o seu caso, ter certeza do que está sendo segurado e contra quais riscos. 'O seguro rural é importante para dar equilíbrio tanto econômico quanto emocional ao produtor, sempre sujeito a esse risco climático. Se o agricultor tiver uma grande perda em um ano, sem nenhum tipo de ação para apoiá-lo, a próxima safra pode nem ocorrer', analisa Konrad.

No Banco do Brasil, onde o crescimento da contratação de seguro agrícola nacionalmente registrou alta de pouco mais de 30% de janeiro a setembro, o Rio Grande do Sul registrou mais do que o dobro de crescimento. De acordo com Paulo Hora, superintendente de seguro rural da Brasilseg, no Estado a demanda aumentou 76% no mesmo período.

O sol que massacrou quase metade das lavouras por aqui e sinalizou com força a necessidade do seguro agrícola na atual temporada também jogou para o alto o número de sinistros. De acordo com o executivo, o mercado como um todo somou R$ 1 bilhão em indenizações liberadas no seguro agrícola no Rio Grande do Sul neste ano.

'Esse valor representa uma sinistralidade de 175% no mercado. Ou seja, para cada R$ 1 que as seguradoras receberam em prêmio no RS, pagaram R$ 1,75 em sinistro. A Brasilseg indenizou aproximadamente metade desse valor, algo como R$ 500 milhões só no Rio Grande do Sul de janeiro a setembro', calcula o executivo.

A maior dificuldade no Estado, hoje, além de menos seguradoras assumindo o risco de segurar as lavouras, é a janela de plantio. 'O Rio Grande do Sul é um dos últimos estados a iniciar plantio. Com isso, muitos agricultores já não conseguem a subvenção porque os recursos da União costumam terminar antes. Neste ponto somos prejudicados em relação ao Centro-Oeste, por exemplo, que começa os trabalhos meses antes', critica Konrad.

Números em destaque

Foram utilizados até agosto, segundo a FenSeg, em torno de R$ 680 milhões em subvenção ao prêmio. O que auxiliou financeiramente os produtores a contratar cerca de 149 mil apólices, com um valor total segurado de R$ 33 bilhões.

No Brasil, a arrecadação do seguro rural chegou a R$ 4,38 bilhões no acumulado de janeiro a agosto, um crescimento de 27,7% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados da Susep.

Além dos grãos, pecuaristas e agricultores movimentaram outros mercados. Também tiveram alta o seguro de vida para produtores (32%), animais (15%) e penhor rural (9%). Em todo País, há um ano, 52% dos seguros agrícolas tinham sido contratados com subsídio. Hoje, chega a 89%, de acordo com a FenSeg.

Investir para mitigar perdas aprofunda raízes no agronegócio

A instabilidade climática que assolou o Sul do País no verão passado e a histórica área atingida por queimadas no Centro-Oeste acabaram levando o seguro rural a um novo patamar no Brasil. E também reforçou o mercado, as ações de diferentes instituições e o próprio desenvolvimento de produtos.

Dois dos principais bancos públicos com atuação no Rio Grande do Sul e no agronegócio gaúcho, o Banco do Brasil e o Banrisul, colheram bons frutos neste ano simbólico para o setor. Também estão semeando novas estratégias para 2021, que deve ser igualmente promissor para a atividade.
De acordo com Paulo Hora, superintendente executivo da Brasilseg, empresa BB Seguros, apenas entre janeiro e setembro de 2020 a instituição financeira soma 7 milhões de hectares segurados e projeta alcançar 8 milhões até o dezembro. Isso de um total de cerca de 14 milhões de hectares previstos para contar com algum tipo de proteção no Brasil. Neste cálculo, o Rio Grande do Sul corresponde a 20% das contratações do banco, com 1 milhão de hectares.

Mas, ao ser mais acionado para arcar com as indenizações por perdas causadas pela estiagem que massacrou lavouras no Estado, de certa forma, o setor de seguros também se retrai. Com o custo elevado por um volume maior de sinistros e a nova ameaça de déficit hídrico prevista para este ano, algumas seguradoras limitaram a cobertura. A decisão também leva em consideração questões de equilíbrio de contas e potencial financeiro para arcar com pagamentos futuros.

'Muitas seguradoras não estão mais fazendo contratos há algum tempo. Não é o nosso caso. Ainda estamos e seguiremos atendendo o produtor', diz Hora, ao alertar que, quem deixar para fazer seguro muito tarde, poderá não conseguir cobertura para sua lavoura.

O executivo acrescenta que, na Brasilseg, um dos investimentos mais constantes e crescentes tem sido justamente em tecnologias que ajudem a aumentar a previsibilidade climática. O que é positivo para a operação e para o produtor, inclusive ampliando serviços voltados a pequenos agricultores. O próprio Ministério da Agricultura, destaca Hora, tem reforçado ações de esclarecimentos sobre seguro rural, monitoramento de riscos e capacitação de peritos.

Sem falar dos recursos, claro, para este e o próximo ano: além dos R$ 880 milhões de subvenção previstos até dezembro, há programados mais R$ 1,06 bilhão para 2021 - montante que o setor espera que aumente para R$ 1,3 bilhão. 'Essa previsibilidade dá segurança ao mercado, na conversa das seguradoras com os produtores e aumenta a demanda', afirma Hora.

Robson Santos, superintendente da área agronegócios do Banrisul, chama a atenção para o fato de que o novo risco climático que agora se avizinha sobre as lavouras gaúchas eleva a necessidade de seguro. Agomar Aliatti, que responde pela área de Seguros, Previdência e Capitalização do banco gaúcho, também adverte para o fato de que o cenário anterior - de perdas e ameaça de mais uma estiagem - restringe a oferta de coberturas. 'Por isso, é importante termos cada vez mais empresas atuando no setor', afirma. Hoje, o Banrisul opera com três seguradoras no segmento. 'Queremos ter ao menos mais uma em 2021, ou até duas. Assim, o produtor tem mais opções caso uma ou outra porta se feche', completa Aliatti.

De acordo com Santos, em termos de área cobertura, a soja, claro, é a campeã. Depois vem o arroz e, em terceira posição, o milho. Mas enquanto soja e milho têm acima de 95% das operações realizadas pelo banco, no custeio do arroz o seguro entra em apenas 85% das operações, principalmente por serem grandes áreas de plantio.

'Em 2020, cresceu muito a procura por garantia não apenas nas culturas de verão, mas também de inverno, com uma alta nacional de 88%. No trigo, em termos de operação de custeio do banco, 99% tiveram seguro neste ano', detalha Robson.

No Banrisul, o seguro agrícola é uma atividade recente e promissora, assegura o responsável pelo segmento de agronegócio. O banco passou a atuar com o serviço há apenas três anos, mas é uma das maiores apostas de produtos para este e os próximos ciclos. 'O setor é o que mais cresceu na carteira do Banrisul. De uma média de 15% no segmento de seguro, o rural prevê 85% de incremento em relação a 2019', conta Aliatti.
A área de Seguros, Previdência e Capitalização do Banrisul também registra, neste ano, aumento da procura pela contratação de seguro sobre patrimônio rural, e a tendência é que a expansão continue nos próximos anos. 'Isso inclui máquinas agrícolas e outros equipamentos usados na produção e transporte de grãos, que exigem altos recursos investidos pelo produtor e que ainda são pouco segurados', avalia Aliatti.

Cátia Rivelles, representante da Mapfre na Comissão de Seguro Rural da Federação Nacional doa Seguros Gerais (FenSeg), acrescenta, como tendência, a adoção de métricas mais personalizadas no momento de calcular riscos, produtividade e outras referências.

A executiva destaca ainda o avanço de normatizações e adoção do serviço por culturas ainda pouco usuais. 'O cultivo de banana, por exemplo, sofreu muito em função dos ciclones-bomba que atingiram o Sul do Brasil e, neste ano, foi incluído no programa de Seguro Rural (PSR) do Ministério da Agricultura', relata Cátia.