Artigo: Seguro e renda
O seguro é uma ferramenta importante para a estabilidade social
O Estado de S. Paulo - 19 de Outubro de 2020Por
Antonio Penteado Mendonça, no Estadão
As
estatísticas mostram que a penetração do seguro é muito maior nos países desenvolvidos
do que nos países pobres. É o retrato óbvio. Não poderia ser diferente. Não
porque os países desenvolvidos tenham uma população melhor, mas porque os
países desenvolvidos têm políticas sociais mais eficientes, começando por saúde
e educação, que dão aos seus cidadãos não apenas uma percepção mais clara dos
princípios éticos e morais essenciais para forjar a argamassa necessária ao
desenvolvimento social, mas a chance concreta de viver de acordo com eles,
suportados por eles e suas consequências nos desafios da vida cotidiana.
Ninguém
é miserável porque quer. Ninguém vive abaixo da linha da pobreza, com no máximo
um salário mínimo, porque acha bonito. Se resolver o problema da desigualdade
social fosse fácil não tinha desigualdade social no mundo, nem diferença
gritante entre o grau de desenvolvimento das nações. Todos seriam ricos, teriam
saúde e educação e o bem estar social seria uma realidade e não promessa de
campanha eleitoral. Só que não é assim. A maioria dos países é pobre, seus
habitantes são pobres e as chances de mudar este quadro hoje são, no mínimo,
remotas.
Não
cabe aqui fazer um resumo da história do mundo. Os problemas de cada um são os
problemas de cada um. Por isso, não existe uma fórmula mágica que resolva as
diferenças entre as nações. Não adianta imaginar que simplesmente importar
soluções resolva alguma coisa. Não resolve, a não ser que antes dela se tenha
claro o objetivo, o estudo necessário para dimensioná-lo, o projeto para
alcançá-lo e os meios para se chegar lá. A única regra aplicável a todos é que
sem saúde e educação não é possível a existência de sociedades desenvolvidas.
É aí
que as diferenças entre países ricos e pobres tendem a crescer. As nações
desenvolvidas têm sistemas de saúde e educação eficientes e que dão às suas
populações as ferramentas para continuarem a progredir. Têm programas sociais e
de transferência de renda que garantem ao cidadão o mínimo para viver com
dignidade e aos seus filhos a chance de terem um futuro melhor. Têm geração de
riqueza e poupança para garantir os investimentos necessários a manter seus
índices de desenvolvimento. Ou seja, a bola de neve desce a montanha e cresce
sempre.
Neste
cenário, o seguro é uma ferramenta importante para a estabilidade social. Tendo
por objetivo repor as perdas de integrantes da sociedade atingidos por eventos
danosos, ele se vale de princípios aglutinadores, como solidariedade,
compaixão, geração de poupança e divisão dos prejuízos para garantir a
preservação das vítimas através da reposição do patrimônio ou da capacidade de
atuação atingida pelo evento, custeada proporcionalmente por cada integrante do
grupo.
Ao
fazer seguro, os integrantes de uma sociedade garantem os meios para bancar seu
desenvolvimento. Como, no caso de uma perda, a obrigação de ressarci-la é da
seguradora, eles preservam sua capacidade de investimento, já que não precisam
realocar seus recursos para arcar com os prejuízos.
As
sociedades pobres têm baixa capacidade de poupança. Parte importante de seus
integrantes está abaixo ou próxima da linha de pobreza. Seus ganhos
invariavelmente são insuficientes para garantir um padrão mínimo de bem estar
social e os gastos, por falta de opção, se restringem a comer, morar e se
vestir. Consequentemente, não têm os excedentes ao menos para pagar uma série
de serviços indispensáveis ao incremento mínimo de sua qualidade de vida, que
deveriam ser disponibilizados pelo poder público, tradicionalmente ausente.
Sem
recursos para alimentação, moradia e vestimentas decentes, sem saúde, educação
e segurança eficientes não há como se falar em outros gastos, entre eles a
contratação de seguros. Esta é a diferença entre a grande empresa e o morador
de uma comunidade. Se um sinistro atinge a empresa, sua seguradora indeniza e
ela toca em frente. Se um sinistro atinge o dono de um pequeno estabelecimento
numa comunidade, ele e sua família perdem tudo e voltam para a miséria.