Artigo: O futuro seguro
Por Marcio Serôa de Araujo Coriolano, no Poder 360
Chegamos a um paradoxo: o de planejar o futuro estando em
um presente ameaçado gravemente por uma doença, a covid-19, causada pelo novo
coronavírus. O ânimo vem de promissoras vacinas que estão a caminho e dos
indícios de que a vida vai, aos poucos, voltando a se movimentar mundo afora.
Mas, que futuro é esse? Não é possível afirmar muita coisa porque a sociedade
ainda está passando por um grande trauma, e as pessoas devem sair diferentes do
'outro lado'.
Porém, pelo menos um legado destes tempos difíceis parece
claro: a busca por segurança. Neste contexto, o crescimento do mercado de
seguros, quando tudo parece ruir em volta, tem ligação direta com a experiência
covideana. Ninguém quer ser surpreendido, novamente, por algo que vire a vida
de cabeça para baixo, quebre a empresa de uma hora para outra, leve à morte
tantas pessoas queridas.
Em junho se comparado ao mês de maio, os seguros alcançaram
índices robustos de expansão: quase 33%, potencializado pelo VGBL (Vida Gerador
de Benefício Livre), e 18,3%, sem essa alavanca. A demanda é ampla. Estudos
apontam para um maior grau de exigência das pessoas em relação à
sustentabilidade, às questões sanitárias e ao investimento científico. Tudo
isso está relacionado ao seguro. Aprendemos, a duras penas, que a negligência
com saneamento, água, floresta, lixo, pode custar muito caro, ceifar vidas.
Como a tendência é de que catástrofes ambientais se repitam, a prevenção é
prioridade. O desafio é falar de segurança em um cenário pós-pandêmico coalhado
de desemprego e baixa renda.
No caso do Brasil, uma rápida olhada para trás, entretanto,
evidencia que o novo coronavírus não inventou a crise, apenas agravou o quadro
recessivo em andamento. O que a doença alterou, de fato, foi o conceito de
risco. Hoje, ninguém quer ouvir o alerta popular sobre a impossibilidade de um
raio cair duas vezes sobre a mesma cabeça, porque ficou provado que, sim, ele
cai até mais vezes, uma vez que famílias ou patrimônios foram dizimados nesta
tempestade.
A covid-19 provocou o rastreamento consciente, qualificado
e global, ao mesmo tempo, de cauções possíveis. Os seguros pessoais e
empresariais protegem a vida e o patrimônio; as ações individuais e coletivas
protegem o mundo. Essa conta só fecha com a participação dos governos na
promoção do desenvolvimento e da igualdade social. Até 2018, por exemplo, 67%
da população brasileira ganhava menos do que 2 salários mínimos por mês. A
ideia da prevenção está diretamente relacionada à do desenvolvimento. O país
precisa crescer para que mais gente tenha acesso a padrões mínimos de renda,
alimentação, higiene, saúde e, na esteira, à proteção. A pandemia deu
visibilidade a esses problemas seculares e que têm que ser resolvidos.
Alternativas estão sendo criadas, adaptadas ou
flexibilizadas. Por exemplo, a cobertura intermitente, que pode ser
bem-sucedida em apólices de automóveis, celulares e bicicletas, para citar
alguns, tem perfil adequado para épocas de orçamentos menores. Mas é
interessante notar que a pandemia recuperou a importância do seguro anual de
automóveis. O carro se transformou em uma 'cápsula móvel' de
proteção. Em relação à residência, o isolamento social sacramentou uma mudança
de comportamento que veio para ficar: o home office. Muitas moradias passarão a
ser, em definitivo, ambiente de trabalho, e essa fusão pode significar
economia. De seu lado, a Susep (Superintendência de Seguros Privados) tem
demonstrado estar comprometida a analisar as diferentes modalidades em esforço
conjunto.
Mais do que nunca, o sentimento de fragilidade encontra
conforto no 'seguro emocional' -a fundamental sensação de
acolhimento. O diálogo no pós-pandemia terá um foco central: estamos retomando
as atividades, houve perdas nos negócios e como viabilizar a proteção à vida, à
residência, à saúde, à empresa, etc.? O seguro é parte preponderante do
desenvolvimento civilizatório e o Brasil, enfim, absorve essa cultura. Esse é o
futuro.