Preocupação com mudança climática domina agenda do FMI
“Se eu pudesse dar um conselho para todos nós é: todos temos responsabilidade de agir”, disse a diretora-geral do fundo, Kristalina Georgieva,
O Estado de S. Paulo - 17 de Outubro de 2019O Estadão destaca que depois de ser tratado como prioridade na Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), há pouco menos de um mês, o tema das mudanças climáticas entrou no palco principal do Fundo Monetário Internacional (FMI). O encontro anual do banco, que teve início na terça-feira, 15, têm previstas ao menos 16 reuniões que tratam de políticas fiscais que ajudam a mitigar aquecimento global, biodiversidade, governança ambiental e uma “transição verde”.
“Se eu pudesse dar um conselho
para todos nós é: todos temos responsabilidade de agir”, disse a diretora-geral
do fundo, Kristalina Georgieva, ao participar de debate sobre o papel dos
bancos centrais no combate às mudanças climáticas. “No FMI, sempre olhamos para
os riscos. E essa (mudança climática) é uma categoria de risco que tem que ser
absolutamente central no nosso trabalho”, afirmou.
“Primeiro, pelos riscos de desastres para a
estabilidade dos países. Temos visto como um furacão pode tirar mais de 100% do
PIB em Dominica. E, segundo, pelos riscos da transição. Todos reconhecemos hoje
em dia que o caminho para crescimento e criação de trabalho precisa ser de
baixo carbono. A transição de uma economia de alto para baixo carbono não é uma
tarefa trivial e temos responsabilidade de cuidar da compreensão desses riscos,
classificá-los e, mais importantes, trazer políticas para geri-los”, afirmou a
chefe do FMI.
Horas antes, o fundo divulgou o
Monitor Fiscal de outubro, que teve como tema central o aquecimento global como
uma ameaça ao planeta - e formas de usar a política fiscal para mitigar
“efeitos danosos e mortais” gerados pelas mudanças climáticas.
“A ação até agora tem sido
inadequada. O Acordo de Paris de 2015 vai na direção certa, mas os compromissos
que os países fizeram são menores do que o necessário para limitar o
aquecimento global ao nível considerado seguro pelos cientistas”, considera o
fundo.
Outro problema, segundo o FMI,
é que há incerteza se os países têm reduzido as emissões de carbono conforme o
combinado.
O relatório argumenta que, de
várias estratégias, a mais poderosa e eficiente é a taxação de carbono.
“Se a taxação de carbono não
for realizável, o sistema de trocas de emissão seria igualmente eficiente se
aplicado a uma gama ampla de atividades econômicas”, afirma o fundo.
Para o FMI, os países com
maiores emissões de carbono - Índia, China e Estados Unidos - deveriam
participar de uma articulação global para definir uma política de preços
mínimos.
Governos como o do presidente
Donald Trump, nos Estados Unidos, no entanto, têm resistido a um debate mais
rigoroso sobre as políticas de mitigação de mudanças climáticas. O americano já
chegou a questionar a existência do aquecimento global - o que classificou em
uma de suas intervenções como “invenção dos chineses”. Para o FMI, países que
refutam o reconhecimento do problema precisam sentar à mesa, ou sofrerão consequências
econômicas impostas pelos demais.
“Todo mundo precisa fazer sua
parte e é importante que os países pensem em chegar a acordos, tanto domésticos
como internacionalmente, sobre como fazer essa transição. Se alguns países
estão relutantes em fazer esse debate, há propostas no debate público. Há
grupos de países que dizem 'bem, se introduzirmos a taxação de carbono e outros
não, iremos fazer um ajuste nas tarifas de importação destes outros países para
que haja competição em pé de igualdade dentro da nossa economia'”, afirmou
Paolo Mauro, diretor no fundo.
Limitar o aquecimento global ao
padrão seguro de 2ºC ou menor exige políticas de escala ambiciosa, argumenta o
fundo, como a imediata taxa sobre carbono que cresça rapidamente para US$ 75 a
tonelada de CO2 até 2030. Nesse cenário, estima o FMI, o os preços de
eletricidade subiriam, na média, 45% em 10 anos e os da gasolina aumentariam
15% na comparação com um cenário sem implementação dessa política. A receita da
taxa representaria 1,5% do PIB em 2030, na média, para os países do G-20 - do
qual o Brasil faz parte - e, segundo o FMI, poderia ser distribuída para dar
suporte a famílias de baixa renda, apoiar trabalhadores ou comunidades afetados
de uma forma desproporcional - como os ligados à mineração de carvão, diminuir
outras taxas, reduzir déficit fiscal.
Todo mundo precisa fazer sua
parte e é importante que os países pensem em chegar a acordos, tanto domésticos
como internacionalmente, sobre como fazer essa transição
“Tenho esperança de que no ano que vem eu
possa dizer que estamos um passo à frente. Se não fizermos isso continuaremos a
fazer coisas burras, como investir em negócios de agricultura em lugares que
serão afetados por secas como regra geral”, afirmou a diretora-geral do FMI.
Kristalina Georgieva afirmou
que o fundo tem agido de forma rápida para integrar os riscos climáticos nas
pesquisas realizadas.
Sobre o papel dos bancos
centrais, ela disse que há questões controversas a serem debatidas, como o
poder de que as instituições ajam de forma proativa para desestimular
investimentos não verdes.
“Em outras palavras, as taxas
de juros para investimentos verdes podem ser diferenciadas?”, questionou.
A diretora-geral do FMI disse
ainda que mesmo países como os EUA têm avançado no tema, ainda que isso não se
reflita “no quanto tem sido formalizado em política governamental”.
“Se olharmos o que cidadãos e
empresas têm feito, não acho que os EUA estão atrás”, afirmou.
Presente no debate sobre o
papel dos bancos centrais no combate ao aquecimento global, Philip Lane, membro
do Conselho Executivo do Banco Central Europeu, afirmou que é necessário
assegurar que todos incorporem corretamente os riscos climáticos nos seus
ativos.
“Muito aconteceu nos últimos
dois anos, mas acho que precisamos fazer isso corretamente, especialmente como
Bancos Centrais. Não é tanto o que nós pensamos, mas o fato de que se há riscos
significativos todos devem estar respondendo”, afirmou Lane.
Na mesma reunião, Sabine
Mauderer, do Conselho Executivo do Banco Central da Alemanha ponderou que as
autoridades monetárias precisam lidar com a questão do aquecimento global, mas
não podem substituir as políticas governamentais sobre o tema.
“O que os Bancos Centrais devem
fazer é lidar com o risco climático para a estabilidade fiscal”, afirmou.