Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras
AS SEGURADORAS NÃO DARÃO CONTA
A única certeza é que o sistema internacional de seguros não tem capacidade para fazer frente ao total das indenizações decorrentes dos sinistros que devem atingir a humanidade nos próximos anos. 10 de Setembro de 2021A única certeza é que o sistema internacional de seguros não tem
capacidade para fazer frente ao total das indenizações decorrentes dos
sinistros que devem atingir a humanidade nos próximos anos.
Hoje, se todos os sinistros fossem indenizados, as seguradoras já não
teriam capacidade para arcar com as indenizações. Aliás, se apenas os sinistros
acontecidos nos países ricos tivessem cobertura de seguro seria suficiente para
inviabilizar o sistema porque o total dos prejuízos é maior do que o limite
operacional do setor.
A soma das capacidades das seguradoras e das resseguradoras não cobriria as
indenizações, ainda que os eventos acontecendo em locais e tempos diferentes, que
é a base da operação de seguro. Os sinistros acontecem em determinado lugar,
atingindo um determinado número de segurados, enquanto outros, em princípio a
maioria, ficam à margem, não são afetados pelas perdas, o que faz com que a
soma de todos os prêmios seja suficiente para pagar as indenizações.
É aí que mora o problema, ou o primeiro dos problemas. Os eventos estão
acontecendo cada vez com mais frequência e os danos também têm aumentado de
valor. Quer dizer, a ocorrência de um número maior de eventos, somada ao
aumento do valor dos prejuízos, seja pelo número de pessoas atingidas, seja
pelo custo mais alto dos danos, tem como resultado o aumento dos valores pagos
a título de indenização e, a se manter a tendência – o que é uma certeza no
campo dos eventos de origem climática –, os pagamentos de sinistros podem
atingir patamares capazes de inviabilizar todo o sistema.
Já existem regiões que são riscos excluídos pelas seguradoras. É o caso
de Miami para o risco de furacão ou de parte da Itália para o risco de
terremoto. A ordem de grandeza dos danos
torna impossível garantir cobertura securitária para os imóveis ali
localizados.
Seguradoras e resseguradoras estão cientes do problema e faz tempo que
estudam a fundo os novos riscos que ameaçam o ser humano, os quais são
extremamente variados e abrangem um amplo espectro de situações.
Faz tempo que são tomadas medidas destinadas a minimizar os danos. Por
exemplo, as construções chilenas, em função da alta incidência de terremotos,
têm normas de construção mais severas do que as construções brasileiras.
Mas essas medidas são claramente insuficientes diante do novo cenário. A
urbanização do planeta, com cada vez mais gente trocando o campo pela cidade,
tem um impacto dramático no quadro. O aumento da concentração de pessoas e de
suas atividades em áreas relativamente pequenas, mais sujeitas a desastres
naturais, é um processo irreversível nos países do terceiro mundo.
Enquanto isso, nos países desenvolvidos, onde a concentração urbana é
realidade faz mais tempo, o aumento da intensidade dos eventos também tem sido
devastador. Basta olhar o que aconteceu na Alemanha, por causa das chuvas, e em
Nova Iorque, por causa do furacão Ida.
Mas não são apenas os eventos de origem climática que podem elevar a
conta. As pandemias estão aí e devem continuar cobrando preços cada vez mais
caros de bilhões de pessoas atingidas por elas. E as ações humanas também têm
sua parte no custo total dos prejuízos. Ações criminosas ou culposas envolvendo
o universo da TI, internet, automação, etc., já custam trilhões de dólares por
ano e a tendência é esse número subir bastante no futuro.
Este ano o setor de seguros deve ultrapassar a casa dos sete trilhões de
dólares de faturamento. É uma ordem de grandeza relevante, maior do que o PIB
da maioria dos países. Todavia, apenas os “sequestros” cibernéticos, em 2021,
devem ultrapassar a casa dos vinte bilhões de dólares em prejuízos. As perdas
globais decorrentes da pandemia do coronavírus devem ultrapassar em muito os
trilhões de dólares. E as perdas provocadas pelos eventos de origem climática
não ficam atrás.
Nesse cenário é poesia imaginar que o setor de seguros dará conta do
recado. Não tem como. Ou os governos e as seguradoras começam a conversar e
delimitar as respectivas áreas e limites de atuação ou a história vai acabar
mal.