Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras
O FIM DO “SEGURÊS”
O mundo está passando por um processo acelerado de empobrecimento das línguas nacionais. 13 de Agosto de 2021O mundo está passando por um processo acelerado de empobrecimento das
línguas nacionais. Muito por conta da queda do nível de ensino em todos os
países, motivado, nos países ricos, principalmente pela mobilidade social
decorrente dos mais variados fatores, que interfere ativamente no
desenvolvimento das populações urbanas, as línguas perderam muito de sua
riqueza, com as pessoas utilizando, em média, pouco mais de mil palavras para se
comunicarem. É muito pouco.
E este quadro tem se agravado mais pelo efeito devastador das redes
sociais, que reinventaram a escrita, substituindo palavras por abreviações e
sinais, diminuindo de forma radical o vocabulário de milhões de pessoas, que se
comunicam através dessa “escrita” subdesenvolvida, engordada nas línguas
nacionais por palavras tiradas do inglês e adaptadas em sua nova ortografia.
Em princípio, o processo, pela sua mediocridade e pelas consequências
sociais geradas, não é bom para a civilização. O empobrecimento da linguagem é
ruim, diminui a capacidade de raciocínio e de expressão das pessoas,
dificultando a assimilação de ideias mais complexas, seguindo, num roteiro
real, a trama deprimente e depressiva do livro “1984”, de George Orwell. Em
certo sentido, já ultrapassamos em muito a ideia do “Big Brother”, a vigilância
incessante da população, para cair na alienação necessária para transformar a
espécie humana num imenso rebanho, facilmente pastoreado pelos controladores
das redes sociais.
Mas se esta realidade é muito ruim, para não dizer perversa, outros
movimentos de simplificação da linguagem têm resultados opostos e não podem ser
confundidos com a estupidificação social em curso.
Ernest Hemingway dizia que o grande escritor é aquele que consegue
explicar um tema complexo de forma simples. É das coisas mais difíceis de serem
feitas. Quem escreve sabe. Mas há também processos que, sem perder a
profundidade intelectual envolvida, simplificam e facilitam a compreensão e o
manuseio da ideia básica, tornando sua compreensão e, consequentemente, sua
operacionalização algo mais fácil, lógico e efetivo.
É o que vai acontecendo no setor de seguros. Durante décadas, o setor se
valeu de uma linguagem hermética, incompreensível até para parte de seus
integrantes, para fazer negócios, redigir contratos, explicar conceitos e,
acima de tudo, regular sinistros e pagar indenizações. Durante anos, o
“segurês” pautou as relações envolvendo seguros, com termos tão complicados
como prêmio, primeiro risco relativo, valor atual e valor de novo, etc. Essa
época está chegando ao fim.
Atualmente, boa parte dos documentos está sendo escrita em linguagem
clara, com palavras e expressões de uso rotineiro e de fácil compreensão para
as pessoas medianamente alfabetizadas.
No lugar de prêmio, agora se fala em preço. No lugar de definições como
seguro proporcional e seguro não proporcional há uma explicação de como as
indenizações serão pagas. E por aí vai, com vantagem para todos, na medida que
o termo incompreensível, a palavra com sentido estrito e específico para o
setor, não é mais usada a favor ou contra quem quer que seja. Banana é banana e
cebola é cebola. Da mesma forma que nas rotinas do mundo real as coisas têm
cara e nome, agora, no setor de seguros, sinistro deixou de ser algo tenebroso
para se transformar no evento que gera prejuízo para o segurado e que pode ou
não gerar uma indenização a ser paga pela seguradora. O sinistro de automóvel
passou a ser a batida. O sinistro de incêndio é o fogo, sinistro de transporte
é o roubo da carga e assim por diante.
É uma mudança colossal e que vai muito além de simplificar os termos do
contrato. Com ela, conceitos antes incompreensíveis passam a ser facilmente
assimiláveis e sua compreensão faz com que o segurado entenda as diferentes
situações e se posicione com mais certeza diante de cada momento, tanto faz se
a contratação do seguro, o aviso de sinistro ou o pagamento da indenização.
Mas se o novo quadro torna mais fácil a vida do segurado, a mesma verdade
vale para seguradores e corretores de seguros. É muito mais simples, objetivo e
rentável todos entenderem o que estão falando.