Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras
SEGURO E JUROS MAIS ALTOS
O Banco Central, depois de vários anos sem elevar os juros, na última reunião do Procon, aumentou a taxa básica de 2.0% para 2.75% ao ano. 19 de Março de 2021O Banco Central, depois de vários anos sem elevar os juros, na última
reunião do Procon, aumentou a taxa básica de
2.0% para 2.75% ao ano. Foi uma mexida importante, que surpreendeu parte
dos analistas que não acreditava numa alta tão expressiva.
A explicação é que foi uma ação destinada a rearranjar a economia, onde o
dólar pressionado poderia causar mais estragos e, de outro lado, o fraco crescimento
e o alto desemprego também estavam cobrando seu preço. Foi também a primeira
ação depois da independência da instituição, o que poderia levar vários
políticos a questionarem o acerto da votação, já que agora o Banco central está
livre das pressões políticas e dos riscos de demissão de seus diretores, o que
abre espaço para outros movimentos na mesma direção, aliás, como sinalizado no
final da reunião que decidiu pelo aumento da taxa SELIC para 2.75% ao ano.
Ninguém gosta de juros altos, ou quase ninguém. Tem quem ganhe com eles
e, consequentemente, não ache ruim movimentos como este. Com certeza, o sistema
financeiro não reclama. E a verdade é que os juros altos são interessantes para
as seguradoras também.
Quando os juros estão muito baixos, a única forma de uma seguradora
controlar resultados industriais negativos é aumentar o preço do seguro.
Resultado industrial é o resultado do negócio do seguro sem qualquer
interferência de juros ou outros custos e receitas. A seguradora recebe o
prêmio e abate dele os sinistros, os custos administrativos, os custos
comerciais, a carga tributária e o lucro dos acionistas. É comum esta conta
acabar negativa, ou seja, a seguradora, em vez de ganhar com o negócio direto,
acaba perdendo dinheiro porque a soma das despesas é maior do que o prêmio
cobrado. Num cenário neutro ou sem impacto de outra natureza, a seguradora
teria que aumentar o preço do seguro para reequilibrar suas contas e remunerar
o capital dos acionistas.
Mas no mundo real não existe cenário neutro e as seguradoras têm uma arma
muito forte para equacionar a conta sem precisar mexer no preço do seguro. É a
enorme massa de dinheiro composta pelos prêmios e reservas que ela aplica no
mercado. Grande parte destes recursos deve obrigatoriamente ser aplicada em
títulos públicos, outra não. Assim, se os juros estiverem muito baixos, ou
mesmo zerados porque a inflação come a remuneração, a seguradora não consegue usar
estes recursos para melhorar seu desempenho. Mas se os juros são mais altos do
que o resultado negativo da seguradora, o quadro muda e as aplicações
financeiras se tornam um importante diferencial no resultado operacional, que é
a soma do resultado industrial com as aplicações financeiras.
Por exemplo, supondo que a seguradora teve um resultado industrial de 2%
negativo e as aplicações financeiras renderam 3% por cento, ela estará ganhando
mais do que o ponto de equilíbrio determinado por sua conta de precificação dos
seguros. Se o resultado empatasse, já estaria muito bom; com 1% a mais, o lucro
é consistente.
O ano de 2020 foi um ano onde o comportamento das seguradoras variou
muito de companhia para companhia. Algumas lucraram bem, outras lucraram,
outras empataram e outras perderam. E os juros de 2% não ajudaram nem um pouco
a conta de chegada de nenhuma delas.
A solução seria aumentar o preço dos seguros. Mas num cenário deprimido
como o atual, com mais de 26 milhões de pessoas sem trabalho, aumentar o preço
do seguro é muito difícil. É por isso que o aumento da taxa básica de juros
chega como um alívio importante para várias seguradoras.
A partir de agora, elas contam com quase 1% cento a mais na conta do
resultado operacional e, de acordo com o indicado pelo próprio Banco Central,
podem continuar animadas, porque no mês que vem deve vir outro aumento.
Como se vê, tem gente que não acha ruim os juros subirem.