Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras
A HORA DA ONÇA BEBER ÁGUA
De acordo com análises internacionais, o Brasil é o país que, no momento, apresenta o quadro mais sério e corre os maiores riscos de uma explosão descontrolada do coronavírus sobrecarregar exponencialmente a rede de saúde nacional. 30 de Abril de 2020De acordo com análises internacionais, o Brasil é o país que, no momento,
apresenta o quadro mais sério e corre os maiores riscos de uma explosão
descontrolada do coronavírus sobrecarregar exponencialmente a rede de saúde nacional.
Que a rede brasileira é insuficiente nunca foi segredo para ninguém, por
isso os governadores tomaram e ainda tomam uma série de medidas destinadas a
abrandar a curva da evolução do vírus para tentar reduzir a velocidade da
propagação da doença.
Mas para que isso aconteça é indispensável a colaboração da população.
Não sei até que ponto a posição irresponsável do Presidente da República tem
influência sobre os números, mas a verdade é que menos de 50% dos brasileiros
está levando o isolamento social a sério.
Para que o isolamento surta efeito e diminua a velocidade da curva da
propagação do coronavírus é necessária adesão de pelo menos 70% da população.
Com os 48% registrados nos últimos dias a velocidade vai explodir e as cenas
vistas em Manaus vão se espalhar pelas mais diversas cidades do Brasil,
ameaçando nos colocar em patamares semelhantes aos norte-americanos, em número
de mortos proporcionalmente ao tamanho da população.
Para dar uma ideia da velocidade da pandemia, em março, a Santa Casa de
São Paulo atendeu 404 pessoas com suspeita de coronavírus; em abril, o número
de suspeitos atendidos chegou a 1800 e continua subindo. Além disso, nos dois
meses analisados, faleceram 82 pessoas apenas no Hospital Central.
Os números do coronavírus aparecem duas semanas depois do fato. Assim, as
pessoas saírem para as ruas agora vai impactar negativamente a evolução da
doença daqui a duas semanas. Da mesma forma que o aumento do isolamento social
também terá impacto positivo depois de duas semanas.
Como as pessoas já estão nas ruas há algum tempo, da próxima semana em
diante todos os números referentes à pandemia deverão ser piores. E a tendência
é que prossigam assim por todo o mês de maio e pelo menos por boa parte de
junho.
Nos próximos sessenta dias o Brasil tem tudo para se transformar num
campeão de mortes pela covid19, deixando inclusive Itália e Espanha para trás.
Enquanto o mundo fala em isolamento, aqui o Presidente da República dá o
exemplo contrário e vai para as ruas sem máscara de proteção e sem tomar
qualquer cuidado com o distanciamento pessoal, para cumprimentar meia dúzia de eleitores
sem noção, que, sabe Deus porquê, acham que o Brasil é diferente e que o vírus
é nosso amigo.
Tanto faz as imagens dramáticas mostradas pela televisão, é como se elas
acontecessem em outro país e que aqui fosse festa. Os mortos no chão dos
hospitais, os enterros coletivos e outras cenas tristes da realidade de Manaus
não comovem as pessoas. É como se com elas não pudesse acontecer nada. Enquanto
isso, as periferias bombam com bailes funks, comércio aberto, gente nas ruas e
nos botequins, batendo papo e bebendo cerveja como se fosse dia de final de
copa do mundo.
Como os hospitais públicos estão sobrecarregados, as autoridades começam
a requisitar vagas na rede particular. Com o aumento da pandemia, os titulares
de planos de saúde privados voltarão a ser atingidos e o número de infectados
vai subir. É aí que mora o problema. Com a rede privada obrigada a ceder leitos
para os pacientes do SUS, com plano de saúde privado ou sem plano de saúde
privado, as pessoas terão dificuldades para conseguir vagas na rede hospitalar
brasileira e as mortes em casa começarão a ser rotina.
Nesta conta perdem todos: o SUS, os planos de saúde privados, mas
principalmente a população brasileira, que contará seus mortos aos
milhares.